sábado, 3 de julho de 2010



04 de julho de 2010 | N° 16386
DAVID COIMBRA


Os cinco espíritos negros

Nelson Mandela era um nobre da tribo xhosa. Nasceu, cresceu e foi circuncidado a ferro frio, num único corte, zupt!, a 30 quilômetros do estádio que hoje leva o seu nome, onde o Brasil foi tristemente eliminado pela Holanda da Copa da África.

Essa tribo fala com estalidos, como muitos povos negros da África. Seu nome se diz “clic tôsa”.

Tente. Não é fácil.

Os xhosas são, antes de tudo, criadores de gado. Mais do que isso: a vida deles gira em torno de suas reses. Um xhosa conhece cada boi do seu rebanho pelo nome, sabe diferenciar um do outro e, mais, é capaz de comandá-lo com assobios. Os europeus chegavam aqui e, ansiosos por um suculento churrasco, compravam um boi dos xhosas. Levavam-no com eles, esfregando as mãos.

À noite, o boi sumia. Como é que um boi some??? É que o xhosa que o havia vendido o chamara com um silvo, e o boi voltara para casa, obediente. Muito irritante para os europeus.

No século 19, essa tribo estava em decadência devido à ação dos homens brancos, que lhes tomavam as terras e, principalmente, as reses. Um dia, uma menina de 14 anos de idade, sobrinha do feiticeiro da tribo, foi buscar água em uma fonte e voltou de lá como que em transe. Contou aos amigos, parentes e vizinhos embasbacados que cinco negros altos, fortes, espadaúdos e de passadas largas haviam aparecido para ela e se identificado como espíritos de seus antepassados. As almas dos negões disseram à menina que tinham decidido expulsar os brancos das terras da África do Sul. Para isso, estavam naquele momento formando um exército invencível.

Os xhosas vibraram com a novidade. Até que enfim teriam suas terras de volta! Mas... Havia um mas. A menina continuou falando. Interpôs uma condição para a entrada dos espíritos na briga: os xhosas precisavam provar sua fé. Como? Tinham de matar todo o seu gado e destruir todas as suas plantações. Desagradável, mas não se preocupassem: os espíritos enviariam gado novo, gordo e saudável, e cereal abundante que encheria os novos silos que eles deviam levantar.

O tio feiticeiro encarregou-se de interpretar essas predições e convencer os chefes xhosas a executá-las. Marcou inclusive o dia da redenção de seu povo: 18 de fevereiro de 1857, cerca de um ano depois da profecia. Nesse dia, o sol nasceria vermelho de sangue e se imobilizaria no céu. Depois rodopiaria no próprio eixo e voltaria ao Leste para deitar-se. Então, tufões varreriam os brancos para o Índico, onde todos morreriam afogados, junto com os descrentes.

Os xhosas obedeceram. Durante um ano, enfrentaram a fome e todo tipo de padecimentos. No dia assinalado pela menina e seu tio, puseram-se a olhar para o céu. O sol nasceu amarelo como sempre e descreveu seu curso imemorial.

Nada aconteceu.

Os xhosas se desesperaram, correram a roer as raízes do solo e os ossos de seus bois abatidos. Vinte mil xhosas morreram naquele período. Outros 30 mil só sobreviveram arranjando emprego junto aos brancos opressores. Os xhosas, o povo de Mandela, padeceram do mesmo mal que os brasileiros que apostaram na vitória da Seleção. Ambos acreditaram em falsos feiticeiros.

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