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sábado, 31 de julho de 2010
01 de agosto de 2010 | N° 16414
DAVID COIMBRA
A quarta mulher do rei
O rei Henrique VIII teve seis esposas. Hoje isso não chega a ser incomum. O Sérgio Jockymann, quando se casou com sua sexta mulher, me disse:
– A gente só acerta depois da quinta. Vai ver é.
Henrique VIII, cada uma de suas mulheres protagonizou histórias ilustrativas. Vou tratar aqui da quarta delas. Chamava-se Ana de Cleves.
Ana era alemã, vivia no continente, o rei não a conhecia. O primeiro-ministro inglês, Thomas Cromwell, insistia para que o casamento fosse realizado por razões políticas: seria uma aliança entre a Velha Álbion e os estados alemães protestantes.
Certo. Mas e se ela fosse um jaburu? Henrique VIII queria saber que tal era a moça, mas, naquele tempo, meados do século 16, não existia Google Imagens, nem Facebook e, pior, nem fotografia. E agora?
O rei não podia simplesmente atravessar o Canal da Mancha para ir cortejá-la, como um pretendente comum. Não era assim que funcionava, casamentos de reis aconteciam mediante contratos lavrados e selados. O jeito foi enviar emissários com a instrução de dar uma boa olhada em Ana e depois relatar tudo ao soberano, de preferência com crua honestidade. Missão delicada.
Como dizer ao alemão que eles pretendiam examinar sua filha? Seria indispensável pedir a permissão do pai, porque naquela época as mulheres, sobretudo as fidalgas, não ficavam zanzando pelos bares da Padre Chagas, era preciso desencavá-las da discrição do lar. Mas os diplomatas foram diplomáticos e o pai, meio a contragosto, concordou em apresentar Ana a eles.
Os ingleses postaram-se no grande saguão do castelo a esperar, ansiosos.
Um arauto surgiu.
Anunciou a chegada de milady.
Ana apareceu, enfim.
E os ingleses se entreolharam. Segundo o relatório que apresentaram depois ao rei, ela estava dentro de “vestidos horrendos”, que impediam a visão de seu corpo, e atrás de um espesso véu negro.
Os embaixadores reclamaram com o pai da moça. Que protestou, fulo:
– Vocês queriam vê-la nua???
In extremis, Henrique VIII mandou à Alemanha o pintor da corte, Holbein, o Moço, a fim de retratar a candidata a rainha da Inglaterra. Esse Holbein era um alemão que havia sido indicado por Erasmo de Roterdan para trabalhar como pintor da corte inglesa. Tratava-se de um grande mestre, um especialista em retratos.
Tinha, portanto, toda a credibilidade para pintar a provável futura esposa do rei. Só que, antes dele partir, o primeiro-ministro Cromwell o chamou e sugeriu que fosse generoso para com a aparência de Ana.
Cromwell não demoraria a se arrepender disso.
O retrato de Ana de Cleves está no Louvre. Recomendo que você vá a Paris para vê-lo. Se não quiser vê-lo, vá a Paris assim mesmo.
No quadro, Ana está de frente. Quer dizer: é difícil avaliar o tamanho de seu nariz, mas ele parece um pouco bulboso. Ela tem uns olhos baços, talvez enfarados. Usa touca, não se lhe pode ver os cabelos. Henrique VIII aprovou o que viu. Contratou casamento. Ao sair da sua Alemanha natal, Ana o fez já na condição de noiva do rei.
Henrique estava tão ansioso para encontrá-la que convocou seus cavaleiros, ordenou que vestissem capas coloridas e partiu a galope ao encontro dela. Alcançou-a em um castelo no interior da Ilha. Ana estava aboletada em um banco sob uma janela, derramando olhares de tédio para o lado de fora. Henrique apresentou-se não como rei, mas como um emissário do rei. Ana olhou para ele, algo aborrecida. Ele olhou para ela.
E ficou paralisado. Era uma feia.
Alta, magra, um grande nariz grudado no meio do rosto marcado por acnes espremidas ou até por alguma velha varíola.
Dias depois, ao encontrar Cromwell, o rei rosnou:
– Não gosto dela! Mas teve de se casar, o acordo já fora selado. Só que Ana era tão desagradável que Henrique não conseguiu consumar o casamento. Manteve-a virgem e intocada como uma bandeirante do CLJ. Depois de seis meses, não suportando mais dividir a cama com aquela assombração, Henrique deu um jeito de anular o casamento.
Ana foi “promovida” a irmã do rei, ganhou uma pensão vitalícia e um suntuoso castelo na Inglaterra, onde foi viver o resto de seus dias de feia.
Cromwell pagou caro por fazer o rei acordar durante seis meses ao lado daquela mulher de assustar criancinha: pouco tempo depois, ele foi levado para a Torre de Londres e de lá, como soía acontecer, arrastaram-no para o cadafalso, onde sua cabeça foi separada do corpo a golpes de machado. Imagine agora o troço que devia ser essa Ana.
Tudo isso porque o rei não pôde vê-la em pessoa. Retratos pintados e testemunhos não bastaram. Era preciso VER. É o que digo do futebol. Na Copa, vi vários times em campo. Vi como se comportavam. O desenho tático de cada um. Neste domingo vou ver os times de Roth e Silas. Espero não levar um susto, como o velho Henrique VIII.
Que inclusive se traumatizou com o episódio. A quinta mulher do rei, Catarina Howard, era linda. Porém, leviana. Traiu-o com ardor, boa parte da corte cevou-se nas suas carnes brancas de loira. Como Cromwell e outras antes dela, terminou decapitada. Apenas Catarina Parr, a sexta mulher do rei, sobreviveu a ele.
Como ensinou o Jockymann, só se acerta depois da quinta.
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