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segunda-feira, 12 de julho de 2010
12 de julho de 2010 | N° 16394
L. F. VERISSIMO
Incesto na final
A seleção da Espanha é o Barcelona reforçado, e o futebol do Barcelona é meio filho da Holanda. Desde os anos 1990, quando Johan Cruyff implantou suas ideias sobre futebol no Barcelona, passando por Louis van Gaal e Frank Rijkaard, técnicos holandeses ditaram não só o estilo de jogar do clube catalão como sua política de formação e aproveitamento de jogadores jovens, que deu no Barcelona e na seleção espanhola de hoje.
Dois dos assistentes do atual treinador holandês foram jogadores do Barcelona. O capitão do time holandês, Van Bronckhorst, e o meio-campo Van Bommel jogaram no Barcelona. Van Gaal, que treinou o Ajax e a seleção holandesa antes de ir para Barcelona, levou tantos jogadores holandeses com ele, incluindo o grande Patrick Kluivert, que o clube chegou a ser chamado de “Barcajax”.
O atual treinador vencedor do Barcelona, Pep Guardiola, era um dos jogadores favoritos do Cruyff. Talvez seja difícil encontrar o DNA da Holanda de Cruyff e dos outros no atual jeito de jogar da seleção espanhola, mas foi decididamente um jogo incestuoso. Antes do jogo, a dúvida era se assistiríamos a um infanticídio ou um matricídio.
Uma decisão nos pênaltis, aquele momento no futebol em que o homem entrega seu destino aos deuses, teria sido um final mais adequadamente grego para o drama. Mas foi um matricídio lento e doloroso que só se consumou no fim. Quer dizer, grego o bastante. O segundo tempo foi muito melhor do que o primeiro porque foi quando o Iniesta começou a jogar, e o Xavi a dialogar com ele.
Os holandeses confiaram nos contra-ataques e principalmente na habilidade e na velocidade do Robben, mas estava escrito: a mãe seria a sacrificada da noite. E para completar um campeonato em que os erros de arbitragem foram tão importantes, ontem houve mais um. Uma falta batida pela Holanda desviou na barreira, mas o juiz não deu o escanteio. O ataque seguinte foi o do gol da vitória do filho. Digo, do Barcelona. Digo, da Espanha.
O Uruguai ficou em quarto lugar, mas foi o campeão emocional. Além de ser mais argentino do que a Argentina, ou mais raçudo do que qualquer outro latino-americano, incluindo, principalmente, o Brasil, por pouco não empatou um jogo perdido para a Holanda e por pouquíssimo não empatou com a Alemanha e adiou a decisão do terceiro lugar.
Aquela bola no travessão do Forlán no último segundo de jogo resumiu o que foi a passagem eletrizante do Uruguai pela África do Sul. Estão falando em dar o prêmio de jogador da Copa ao Forlán. Que nada, deem o de melhor ator de uma série dramática. E prêmios de coadjuvantes para o resto do time.
Mas nada, da cerimônia de encerramento, do jogo final ou de qualquer dos dramas, uruguaios ou gregos, da competição se igualou em emoção à aparição de um sorridente Nelson Mandela no estádio, ontem. Duvido que alguma outra personalidade, na história do mundo, provocasse a mesma manifestação espontânea de admiração e carinho.
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