Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
quarta-feira, 2 de janeiro de 2008
02 de janeiro de 2008
N° 15466 - Sergio Faraco
Velórios do futuro
Na campanha, bom velório é o que oferece canha e café preto à vontade e faculta umas rodadas de Truco. É um velório que vale a pena.
O café mantém todos despertos durante a longa noite, a canha proporciona emocionadas evocações do finado, ao passo que o Truco é uma metáfora, querendo dizer que o jogo da vida continua.
Sim, uns e outros inconseqüentes proferem palavrões enquanto carteiam, mas em regra são advertidos com um coice por baixo da mesa e logo-logo se assossegam.
Já na cidade... Bah, que horror!
Como se o morto não existisse (e ele existe, à moda dele), voga entre os presentes um tal falatório, um tal bulício, quase uma algazarra onde há de tudo, desde negócios e planos para o fim de semana até mexericos sobre as relações extraconjugais daquele que ainda existe e está deitado, ouvindo tudo, ainda que tão plácido quanto um buque de oceano.
Já assisti a velórios em que três ou quatro sujeitos davam gargalhadas à proa do féretro, sem se compenetrar de que, naquele momento, o outro estava iniciando sua perigosa e incerta travessia do Aqueronte.
Ó tempos, ó costumes, exclamava Cícero.
Ai de mim, sinto saudade (bem, não muita) daqueles austeros velórios da aurora da minha vida, da minha infância querida, quando os circunstantes falavam baixo, contemplavam o viajante em contrição e ciciavam ave-marias para que o barqueiro lhe fizesse um bom desconto no óbolo infernal.
E mais as velas fumegando, as coroas a cheirar, as expressões obsequiosas e toda aquela atmosfera funerária que dava gosto e inspirava silenciosas e proveitosas meditações sobre a origem e a destinação da vida, as conjunções planetárias e o princípio da incerteza na teoria quântica...
Era sobre este dilema que outro dia, na Tristeza, eu trocava idéias com o Comandante Soares, segurança do Bistrô do Pátio.
Eis um filósofo.
E como fica parado no pórtico do restaurante até altas horas, dedica-se à observação crítica dos vivos e os mortos da noite tristezense e a aprofundar até limites extremos sua cosmovisão.
Ele entende que a modernidade e seu materialismo, com perdão da palavra, avacalharam tudo, até os velórios.
Na sua opinião, com essa azáfama das pessoas em busca do sustento, com essa falta de respeito que só respeita aquilo que engorda o bolso, no futuro a humanidade não velará seus mortos.
"Vai ter tele-entrega", arrematou. E eu acho que ele tem razão.
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