sexta-feira, 1 de março de 2024


01 DE MARÇO DE 2024
DANIEL SCOLA

Francisco e Milei

Num mundo tão belicoso, cheio de ódio, com guerras matando milhares de pessoas e presidente dando declaração inconsequente, um sinal de maturidade merece destaque. No início de fevereiro, Javier Milei, presidente da Argentina, se encontrou na cidade do Vaticano com o papa Francisco. Um encontro improvável serviu de símbolo de paz.

Durante a campanha eleitoral do ano passado, Milei atacou o Papa dizendo que ele era um imbecil. O Papa, cardel Jorge Mario Bergoglio, não respondeu. Mas estava claro para o mundo que os dois se desgostam. Ocorre que, no Vaticano, existe uma tradição: aconteça o que acontecer, o chefe da Igreja Católica recebe todo chefe de Estado. O Papa não representa só ele, há mais de 1,3 bilhão de católicos no mundo. O Papa é o chefe de uma instituição, assim como Milei é chefe de Estado. Ambos são argentinos e resolveram estender a bandeira branca em nome da civilidade institucional.

Francisco é o primeiro Papa não europeu e foi escolhido em 2013 num momento em que o catolicismo encolhia em todo o mundo. O professor universitário americano Richard Sennett escreveu, ainda em 2013, um ótimo livro chamado Juntos - os Rituais, os Prazeres e a Política da Cooperação. Sennett anteviu aquilo que hoje é uma obviedade: a polarização da sociedade. 

Normalmente, as consequências são brigas e afastamentos. Sennett nos alerta que o trabalho conjunto nos torna mais eficientes. Um pequeno trecho do livro ilustra a necessidade de entendermos o trabalho conjunto: "...procurei explorar a cooperação como uma habilidade. Ela requer capacidade de entender e mostrar-se receptivo ao outro para agir em conjunto?".

Receptividade é a palavra-chave. É isso que a imagem do encontro entre o Papa argentino e o presidente dos argentinos mostra. Durante a audiência, que durou uma hora, Milei pediu desculpas pelo que disse na campanha e presenteou o Papa com alfajores e biscoitos. Francisco pediu que o presidente olhe pelos pobres, que são os que mais sofrem na Argentina. O encontro foi um sinal de cooperação e civilidade, como o título do livro do professor Senett sugere: juntos.

DANIEL SCOLA

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