segunda-feira, 9 de março de 2020



09 DE MARÇO DE 2020
OPINIÃO DA RBS

CORRIDACONTRA O TEMPO

Em recente reunião com movimentos de rua alinhados com a pauta liberal, o ministro da Economia, Paulo Guedes, sentenciou que o governo tem 15 semanas para mudar o Brasil. Referia-se ao prazo em que seria necessário aprovar uma extensa pauta no Congresso, antes do recesso branco das eleições municipais. Nesse pacote de iniciativas, estão reformas fundamentais, como a administrativa e a tributária.

O problema está na constatação de que o cronograma de Guedes é de difícil execução. Primeiro, analisando o passo a passo desenhado pelo ministro, a reforma administrativa já deveria ter sido enviada pelo governo ao Congresso e, na terceira semana de março, passaria pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Mas é o próprio Executivo que vem hesitando. Desde outubro do ano passado, o governo fez sucessivas promessas de que estaria remetendo o texto. A última indicava os dias seguintes ao Carnaval, mas até agora não há qualquer movimentação real nesse sentido. 

Em relação à urgente revisão do sistema tributário brasileiro, emaranhado irracional de impostos, taxas e contribuições, nem sequer se sabe qual é a ideia do governo sobre o assunto e a pauta hoje parece estar apenas sob responsabilidade do parlamento, com o Planalto praticamente apartado das discussões. Resta como alento a declaração do presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, de que "incompreensões e turbulências não vão tirar nem o foco, nem a serenidade dos parlamentares". Apesar disso, o Planalto precisa agir.

Levando em consideração o histórico de vacilação e desarticulação política do governo Jair Bolsonaro, a conclusão é de que ainda há muitos obstáculos a serem vencidos para aprovar esses dois projetos modernizadores da máquina pública e do país. Lamentável, uma vez que, se existissem real interesse presidencial e coordenação no Planalto, seriam temas que poderiam ter iniciado a sua tramitação entre o final de 2019 e o início do ano legislativo de 2020. Seria um alento e traria maior segurança para a economia, ainda mais em tempos de elevada incerteza internacional devido à disseminação do novo coronavírus e de crescimento econômico pífio do país. Em vez disso, o que se vê é o endosso do presidente às manifestações de viés antidemocrático previstas para o próximo dia 15, o que em nada contribui para a formação de um ambiente de harmonia e normalidade institucional.

Mesmo com um cronograma apertado, poderia haver a esperança de evolução até o início do segundo semestre, se ao menos a tramitação e as discussões se acelerassem.

Após o frustrante crescimento de 1,1% do PIB brasileiro no ano passado, o governo poderia ao menos frear a marcha da insensatez, de declarações despropositadas, de controvérsias inúteis e de confrontos infrutíferos. A falta de serenidade, porém, parece ter contagiado o próprio Guedes, que vem se notabilizando neste 2020 por uma série de pronunciamentos descabidos. O superministro, que deveria ser uma âncora da confiança, tem se transformado em mais uma fonte de instabilidade.

O restabelecimento da confiança não virá sem uma trégua nos disparates. O núcleo palaciano poderia se espelhar em outras áreas do próprio governo, que primam pelo bom senso e evitam o palavreado vazio que apenas contribui para alimentar a fogueira da confusão. Se houver um abrandamento da verborragia e uma mudança de postura no trato de assuntos como ambiente, apenas para citar um dos mais delicados, haverá um impacto positivo para a imagem do governo, com reflexos benéficos para o país. Caso contrário, as 15 semanas de Guedes serão apenas o prolongamento da deterioração das expectativas com a continuidade de tensionamentos estéreis, enquanto o dólar sobe e a economia se mantém estagnada, rumo ao quarto ano de decepção. O Brasil precisa de menos barulho e de mais foco nos verdadeiros entraves ao desenvolvimento.

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