sábado, 28 de setembro de 2019



28 DE SETEMBRO DE 2019
JJ CAMARGO

TODOS TEMOS RAZÃO

Não é tolerável achar que todo mundo que pensa diferente é careta, radical ou demente . Que a gente conviva com mais certezas do que dúvidas, parece uma coisa bem razoável, porque, afinal, valemos pelo que acreditamos. Então, é ótimo que estejamos assim, convencidos. O que não é de nenhuma maneira tolerável é a tendência moderna de achar que todo mundo que pensa diferente está irrecuperavelmente equivocado e é careta, ou radical, ou demente.

Certamente, essas manifestações de intolerância estridente têm a ver com a predominância de jovens metralhando nas redes sociais, com aquelas certezas da juventude que vão se diluindo com as dúvidas da maturidade, e a tal ponto e tão continuamente, que os precipitados julgam que as decisões do velho, cheias de ponderações, são apenas a expressão da decrepitude, quando na maioria das vezes são a mais rica manifestação de sabedoria.

Todo mundo se lembra do quanto a juventude foi a era das certezas absolutas, e, sem espaço para dúvidas, éramos os árbitros sempre disponíveis e implacáveis.

Essa evolução antropológica saudável me remete a uma parábola da milenar cultura judaica, que considero primorosa:

Um jovem procura o velho rabino para relatar uma briga feroz que travara com um colega de trabalho. Conta em detalhes o que considerava uma atitude mesquinha e desqualificada. O rabino o escuta em silêncio e pondera: "Meu filho, eu acho que você tem razão. Só recomendo que, se planeja tomar uma atitude, aguarde uma semana. As represálias no calor da indignação, a médio prazo, costumam magoar mais o agressor do que o agredido. Vai em paz e que Deus o acompanhe!".

No final da tarde, o objeto da discórdia procura o mesmo rabino e narra a sua versão do ocorrido e do quanto aquilo exigia uma reparação. Da mesma forma, o rabino, cofiando a barba branca, atribui-lhe a razão e repete a recomendação de prudência na resposta. A esposa do rabino, que, tendo ficado curiosa com a história do primeiro, acompanhou furtivamente e com máximo interesse o depoimento do segundo, assim que este saiu irrompe na sala do marido para confessar seu espanto: "Como pode um rabino que, em princípio, deve ser um árbitro imparcial das rusgas dos integrantes da sua comunidade, dar razão a duas atitudes opostas? Sinto muito, mas acho que hoje o seu desempenho foi constrangedor!".

O rabino, com aquela calma que nasce da fusão de experiência com sabedoria, confessa: "Não se choque tanto, minha querida, porque eu preciso admitir que você também tem lá a sua razão!".

Os indivíduos normais, que cresceram bem amados, e, por boa sorte ou educação adequada, se mantiveram distantes de ideologias escravizantes, e beberam da cultura que abomina a servidão mental, se dão conta que viver é apurar a capacidade de julgamento. E que o juízo precoce, em geral, desmerece quem o emitiu. E só saberemos que a maturidade chegou quando se tornar cada vez mais frequente o uso de dependes antes de um juízo definitivo. Porque a afoiteza é o caminho mais curto para o arrependimento, ou o remorso.

JJ CAMARGO

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