11 DE SETEMBRO DE 2019
NÍLSON SOUZA
A preguiça e os rótulos
O homem do tempo da Globo está sendo alvejado com raios e trovões por internautas baianos por ter dito que Salvador teria "um domingo da preguiça mesmo" devido à chuva do último final de semana. A tentativa de descontração, cada vez mais comum por parte dos apresentadores de televisão que buscam a proximidade com o público, pegou mal. Muitos filhos da Boa Terra sentiram-se ofendidos pelo rótulo regionalista que também costuma ser aplicado aos nativos de outros Estados brasileiros: baiano preguiçoso, carioca malandro, gaúcho bravateiro, mineiro esperto, paulista obsessivo e por aí vai, para ficarmos apenas com os qualificativos civilizados, pois as piadas xenófobas costumam ser ainda mais agressivas na adjetivação.
Há mil teses para explicar a origem desses preconceitos históricos que se propagam e se firmam exatamente por causa da repetição. Os ditos engraçadinhos, precursores dos memes digitais, conquistam mais popularidade quando despertam risos dos ouvintes. Outro dia ouvi esta pérola em meio a uma conversa de gaudérios:
- Cavalo tobiano e castelhano só dá bom por engano!
Tem lá a sua graça, reconheço, mas eu não me atreveria a repeti-la perto do Kannemann, por exemplo. Nunca se sabe quando a vítima do comentário depreciativo vai levá-lo a sério ou fingir que não ouviu. Então, o mais prudente, penso, é sermos sensatos e ponderados nas nossas opiniões. Não apenas por temer uma possível reação, mas principalmente para não correr o risco de ferir alguém. Antes de falar, pensar. E, de preferência, colocar-se no lugar de quem vai ouvir.
Sou adepto do politicamente correto, sem extremismos. Sei que alguns teóricos do liberalismo consideram o autopatrulhamento da linguagem uma espécie de censura branda contra a liberdade de expressão. Abomino censuras e defendo o direito das pessoas de receberem qualquer tipo de informação ou opinião, para que possam fazer suas próprias avaliações sem a intermediação de tutores que se julgam donos da verdade. Mas também acho que todos nós podemos nos atualizar, revisar constantemente rótulos e preconceitos que assimilamos ao longo da vida, muitas vezes sem perceber o quanto podem ser tóxicos e machucar outras pessoas.
Sempre é melhor prevenir do que ter que pedir desculpas, como ocorreu recentemente com o ministro que fez piadinha com a aparência da primeira-dama francesa. Ainda assim, ele agiu bem em se desculpar. Só os arrogantes não reconhecem quando erram. E, como somos humanos, erramos. Todos, sem exceção. Quem jamais disse algo que não deveria ter dito? Não vou sugerir que jogue a primeira pedra, pois nestes tempos sombrios as catapultas parecem estar sempre engatilhadas.
Voltando ao homem do tempo, também acho que ele não fez por mal. Claro, não sou baiano, fica mais fácil ser tolerante nesse caso. Aposto, porém, que na próxima vez ele terá muito mais cuidado com o que vai falar fora do teleponto.
NÍLSON SOUZA
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