terça-feira, 10 de março de 2020


10 DE MARÇO DE 2020
LUÍS AUGUSTO FISCHER

A crônica nasceu ontem

A gente vai ficando velho e se espanta com a naturalidade com que certos fenômenos são vistos como eternos, como tendo nascido na aurora do mundo, quando se sabe que eles vieram à cena faz pouco. Um desses casos é a crônica na sala de aula.

O assunto me veio agora porque ganhei de presente do querido amigo Juarez Fonseca um livro chamado Quadrante, da Editora do Autor, cuja primeira edição é de 1962. Traz crônicas de Drummond, Cecília Meireles, Fernando Sabino, Rubem Braga, Manuel Bandeira e outros, 10 textos de cada. A breve apresentação conta que alguém teve a ideia de ler crônicas no rádio (na voz de Paulo Autran), o veículo mais potente para as massas naquele momento. Foi na Rádio MEC, criada em 1923, de vários bons serviços prestados à cultura nacional e extinta por este senhor que agora ocupa a presidência.

Creiam, a crônica não entrava regularmente na sala de aula antes da segunda metade da década de 1970. Terminei o colégio em 1975 e lembro de ter lido uma que outra, como exceção e talvez ousadia, provavelmente em cópia de mimeógrafo a álcool.

Dou um exemplo que a mim também espanta: tomo a famosa História Concisa da Literatura Brasileira, de Alfredo Bosi (primeira edição em 1970), de larguíssimo sucesso, até hoje reeditada. Isso quer dizer que, em 70, o autor não viu motivos para integrar Rubem Braga ao panteão. (Até a 43ª edição, de 2006, segue sem menção aos cronistas acima lembrados.)

O primeiro best-seller do ramo é a coleção da antiga Ática Para Gostar de Ler, cujo primeiro volume veio ao mundo em 1977, e já com cem mil exemplares. Todos sabiam que era gol, porque a crônica estava já no coração do leitor brasileiro, mesmo os adolescentes.

Acrescento outra data: o primeiro livro do maior cronista brasileiro vivo, Luis Fernando Verissimo, é de 1973: era O Popular. Seu primeiro best-seller no ramo é de 1981, com O Analista de Bagé.

Do jornal para a sala de aula, portando em suas entranhas a língua brasileira. Parecido com a canção, que saiu do rádio para a mesma sala de aula, mas só nos anos mais recentes.

LUÍS AUGUSTO FISCHER

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