terça-feira, 12 de fevereiro de 2019


12 DE FEVEREIRO DE 2019
CARPINEJAR

Mesadas dos filhos para os pais

Há filhos que devolvem as mesadas desde cedo.


Quando vão estudar ou trabalhar na Capital, enviam parte de seu vencimento aos pais que permaneceram no Interior.

Minha mãe, desde o seu estágio na UFRGS, em Porto Alegre, tirava parte do seu salário para a vó, em Guaporé. Todo fim de mês, colava o selo no envelope com o suor do seu rosto.

A vó dizia que não era necessário. A mãe respondia que amar é fazer quando não é necessário. Daí a avó remetia figadas, queijos e salames da colônia para retribuir o zelo. E a mãe retrucava que ela deveria economizar e não gastar com pacotes grandes. E a avó explicava que não deve se economizar no amor. Ambas, pelo vaivém dos Correios, discutiam de tanto se quererem bem.

Há uma delicadeza corajosa em ser responsável pelos protetores na juventude, época em que só se pensa em si, correr o mundo, avançar em seus projetos pessoais de sucesso.

Natural cuidar dos pais na velhice, prodigioso é cuidar dos pais na adolescência. Quando não existe obrigatoriedade, soa mais verdadeiro. Pois sair de casa não significa nunca sair da família. A minha mãe jamais se afastou mentalmente da sua Elisa e de seu Leônidas, isso que era a caçula. Ou, talvez, exatamente por ser a caçula, mantinha a conversa acesa e a preocupação constante.

O que a minha mãe não conseguiu foi comprar o Fusca para a sua mãe. Não deu tempo. Seria o seu primeiro gesto assim que passasse em um concurso público, fato que aconteceu quando a Nonna já tinha falecido.

Ainda mais porque a avó adorava dirigir. Tornou-se uma das primeiras mulheres a tirar carteira de motorista em sua cidade.

Mas alguma coisa sempre fica em aberto ao coração. Em vez de significar uma frustração, revela o poder da intenção, que jamais pode ser apagado. Sonho que não é realizado também é lembrança.

Ainda hoje, a minha mãe ri imaginando o que a avó mandaria de alimentos para agradecer pelo carro. Escapou de receber um armazém inteiro.

CARPINEJAR

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