sábado, 30 de maio de 2009



30 de maio de 2009
N° 15985 - MOACYR SCLIAR


A tentação da carne (e a alternativa para isso)

É só andar por Porto Alegre num domingo e sentir o cheiro que vem das churrasqueiras para constatar: o Rio Grande do Sul é um Estado carnívoro. O que não é de hoje.

A abundância de gado semisselvagem – o gado criado nas Missões e que depois, livre nos campos, multiplicou-se espetacularmente – representava uma fonte barata e acessível de alimento, sobretudo de proteína, a matéria-prima da qual é feita o nosso corpo.

A isto é preciso acrescentar o apelo da carne, vista como um alimento que fortifica, que dá coragem, que prepara para a luta e para a vitória: não por acaso o rei dos animais é o leão, carnívoro por excelência.

Mas, diferente do leão, o ser humano é omnívoro, come de tudo. Mais: transforma o ato de comer em algo psicológico, cultural. E por causa disso a cultura da carne está sendo posta em cheque. Ser vegetariano já não é o resultado de religião ou de uma idiossincrasia pessoal.

É uma escolha racional, adotada por um número cada vez maior de pessoas. Não se trata só da Índia, tradicionalmente vegetariana; 10% dos ingleses já aderiram à dieta, que, ao longo do tempo, teve adeptos famosos: Abraham Lincoln, Brad Pitt, Brigitte Bardot, Mahatma Gandhi, Franz Kafka, Isaac Bashevis Singer, Paul McCartney, Pierce Brosnan, Platão.

O que tem fundamento. Uma dieta vegetariana pode fornecer todos os componentes nutritivos essenciais sem os riscos da carne, cujo consumo está associado a doença cardíaca, câncer e uma menor expectativa de vida, além de ser relativamente cara.

A criação de gado traz riscos para o meio ambiente (o metano eliminado pelos herbívoros contribui muito para o efeito estufa), está associada com doenças, como a hidatidose e os surtos de gripe que periodicamente assolam o mundo.

Parece, portanto, conveniente que a gente comece a cogitar de uma mudança em nossa dieta. E aí temos um choque de mentalidades. Um vegetariano convicto, que faz de sua opção uma causa, é uma pessoa que, olhando para um bife sangrento, vê ali o animal que foi morto e esquartejado. O fã de churrasco, ao contrário, vê um prato saboroso. Como conciliar estas duas atitudes?

A expressão-chave pode ser “vegetarianismo limitado”. Numa experiência na Faculdade de Medicina da Universidade de Michigan (EUA), alunos mostraram-se dispostos a aceitar a ideia de “um dia vegetariano” – no caso quarta-feira, o que talvez seja a origem da “quarta-feira verde” adotada por supermercados.

Mesmo porque há diferentes tipos de vegetarianos: aqueles mais estritos, que não comem nada de origem animal, aqueles que consumirão ovos e/ou laticínios, aqueles que incluem na dieta peixe (muito saudável) ou aves.

In meso virtus, diz o antigo provérbio latino; no meio, não nos extremos, está a virtude. Mesmo um gaúcho extremado concordaria com isso.

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