OPINIÃO DA RBS
CIVILIDADE NA TRANSIÇÃO
Definida a eleição presidencial, o passo seguinte é a formalização do processo de transição. É dever legal do governo que se encerra colaborar com a futura gestão, repassando todas as informações necessárias sobre pontos como o quadro das finanças públicas, a situação dos órgãos do Executivo e o panorama dos projetos e programa em andamento. Trata-se de um procedimento usual, previsto em lei e essencial para a equipe designada pelo eleito não iniciar o mandato no escuro em janeiro de 2023.
Preocupa, no entanto, certa lentidão no contato entre o governo em curso e o que está por assumir para deflagrar a passagem de bastão. De uma forma ou outra, a transição ocorrerá. Noticiou-se no início da noite de ontem os primeiros diálogos entre as duas partes. Seria conveniente e democrático que todos os procedimentos fossem conduzidos com boa vontade por parte dos membros políticos da atual administração. Espera-se que o processo transcorra com a civilidade necessária. Mas não deixa de ser um mau sinal que o presidente Jair Bolsonaro (PL), derrotado por Luiz Inácio Lula da Silva (PT), até o fechamento desta edição, sequer tenha cumprimentado o vencedor e reconhecido o resultado.
Especula-se que, pela parte da campanha vencedora, o coordenador será o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin, que conversou informalmente ontem com o atual ocupante do cargo, Hamilton Mourão. É interesse dos futuros ocupantes do Palácio do Planalto dar início à transição o mais rápido possível. Faltam apenas dois meses para a posse. O prazo é exíguo. Por parte do Executivo, a frente é tomada pela Casa Civil, hoje comandada por Ciro Nogueira (PP), que também no começo da noite de ontem teve um contato preliminar com Edinho Silva, um dos coordenadores da campanha de Lula.
O temperamento do presidente Jair Bolsonaro é conhecido. Mesmo abalado e contrariado com a derrota, espera-se que ainda nas próximas horas, após digerir o resultado soberano das urnas, compreenda que é preciso ter uma postura republicana e contribuir, mesmo que formalmente, com uma transição pacífica e produtiva. Mas seria mais um atestado de mau perdedor se, por um acaso, fosse notada qualquer tentativa de dificultar a transparência e o acesso a dados. A derrota é algo natural para quem disputa eleições, e o Estado brasileiro não é propriedade do mandatário de turno. É indispensável o futuro governo se preparar adequadamente para os muitos desafios à frente - todos, ao fim, de interesse da população.
São imensas, por exemplo, as dúvidas que cercam a questão fiscal devido ao pacote de bondades concedido na busca pela reeleição. Ao mesmo tempo, o governo eleito pretende recompor recursos cortados do orçamento da União de 2023 para programas como o Farmácia Popular. Será preciso encontrar espaço para cumprir a promessa de manter o Auxílio Brasil em R$ 600. Possivelmente será necessário buscar uma espécie de licença para descumprir o teto de gastos, até que se formalize uma nova proposta de âncora fiscal. A transição, portanto, também se dará nas tratativas com o Congresso para remendar o orçamento do próximo ano. Será um primeiro teste de fogo a avaliar a capacidade de negociação da nova gestão Lula.
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