sábado, 25 de abril de 2020



25 DE ABRIL DE 2020
CRISE EM BRASÍLIA

Dólar dispara e retomada da economia fica mais distante

Moeda americana vai a R$ 5,668 e economistas veem maiores dificuldades para recuperação da atividade produtiva. A crise política acentuada pela saída do ministro Sergio Moro representa choque adicional para a economia brasileira em um momento que já era repleto de tensão. Devido ao aumento da turbulência em Brasília, a atividade deve sofrer ainda mais para conseguir deixar no retrovisor os estragos do coronavírus, dizem analistas.

- Quando você está em um buraco, é difícil sair dele. Com a perna quebrada, é ainda mais complicado - compara Alex Agostini, economista-chefe da agência de classificação de risco Austin Rating.

Na sessão de sexta-feira, o dólar acentuou a disparada e chegou a romper a barreira dos R$ 5,70. Fechou a R$ 5,668, alta de 2,54% e recorde nominal. Enquanto isso, a bolsa de valores de São Paulo, a B3, recuou 5,45%, a 75.330 pontos.

- O mercado reage com mais turbulência, vê mais incertezas no futuro e na natureza das políticas econômicas que serão implementadas. Muitas pessoas, eu, inclusive, acreditam que o governo acabou. Em que sentido? O governo atuará para não ser escorraçado do poder até 2022 por suposto crime de responsabilidade - afirma Cláudio Frischtak, sócio-gestor da Inter.B Consultoria. - Temos agora uma camada a mais em um bolo que já era indigesto. Não é apenas uma cereja - acrescenta.

Consultor de investidores internacionais, Frischtak teme que, diante da crise, o Planalto adote medidas de teor "populista". Ele também demonstra preocupação com o fato de que, ao final da pandemia, o rombo nas contas públicas terá crescido no país:

- Com o coronavírus, houve necessidade de transferência massiva de recursos para atender a necessidades da população. Assim, vamos iniciar o próximo ano com fragilidade muito maior nas contas.

Para Agostini, a apreensão com o futuro da economia vem aumentando em razão de uma série de episódios. Além da saída de Moro, os conflitos de Bolsonaro com o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta e a participação do presidente em atos contra o Congresso também azedaram o humor de investidores.

- Os conflitos em que Bolsonaro se envolveu mostram uma intervenção política por parte dele. O problema mora aí. O discurso do governo era de defesa do liberalismo. Mas, nas últimas semanas, houve casos de intervenção - aponta Agostini.

Para o economista, os conflitos tendem a dificultar o andamento de privatizações almejadas pelo governo no pós-pandemia. Na última quarta-feira, o secretário especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do Ministério da Economia, Salim Mattar, disse que as vendas de estatais devem ficar para 2021.

Segundo Marcel Balassiano, economista e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), os efeitos imediatos da crise política atingem principalmente o mercado financeiro.

- A incerteza aumentou absurdamente - resumiu.

Preocupação

Também há inquietação com o futuro do ministro da Economia, Paulo Guedes. Na quarta-feira, o ministro-chefe da Casa Civil, Walter Braga Netto, coordenou a apresentação de um plano de investimentos públicos em infraestrutura, com estimativa de R$ 30 bilhões destinados a obras até 2022. Uma das questões que chamaram a atenção foi a ausência de Guedes no lançamento do programa, batizado como Pró-Brasil.

Ao assumir a pasta da Economia em 2019, o ministro prometeu reduzir o tamanho estatal e destravar privatizações. Ou seja, a ideia de retomar investimentos públicos vai na contramão do ideário liberal defendido por Guedes e celebrado pela maior parte do mercado financeiro.

- O plano lançado pelo governo contraria totalmente a postura do Ministério da Economia. Não dá para entender. Tanto é que se passou a falar em uma possível queda do ministro Guedes - pontua Agostini, economista-chefe da agência de classificação de risco Austin Rating.

LEONARDO VIECELI

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