sábado, 25 de abril de 2020


25 DE ABRIL DE 2020
RODRIGO CONSTANTINO

A pandemia da fome


Quando ficou claro que o coronavírus era grave e autoridades partiram para as drásticas medidas de isolamento, alguns tentaram alertar que era preciso buscar um equilíbrio entre saúde e economia. O presidente foi a principal voz nesse sentido, em que pese sua forma um tanto atabalhoada.

Talvez por isso mesmo, por perceberem aí uma oportunidade política, vários passaram a não só defender com unhas e dentes uma quarentena radical, como a demonizar quem quer que ousasse mencionar o aspecto econômico. Era um "assassino de velhinhos", um insensível preocupado só com o lucro de empresários gananciosos. Governadores como João Doria e Ronaldo Caiado embarcaram nessa narrativa, assim como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia.

Deveríamos escutar apenas os "especialistas", ignorando o fato de que eles conhecem somente sobre uma parcela do todo, e mesmo assim de forma bem incompleta e com divergências sobre como agir. Mas os "dissidentes" foram jogados de lado e os "isolacionistas" eram os únicos com destaque na mídia alarmista. Fechem tudo, fiquem em casa, distribuam dinheiro pelo Estado e depois a gente vê como fica.

Achatar a curva, eis a única meta. Mas quando um município não tem sequer um leito de UTI em seus hospitais públicos, não é preciso uma pandemia para colapsar o sistema; basta uma pessoa com pneumonia! Para muitos locais brasileiros, não foi o coronavírus que causou o "colapso"; ele só expôs a realidade.

Ainda assim, as previsões mais catastrofistas felizmente não se concretizaram. O Brasil não é a Lombardia italiana, pelo visto. Não obstante, governadores comprometidos demais com o discurso isolacionista demoram a rever suas posições, e cada dia que passa produz mais desempregos. A crise do coronavírus poderá jogar mais de 265 milhões de pessoas no mundo para uma situação de fome. O alerta não é de Bolsonaro. Foi feito pela FAO, braço da própria ONU.

A miséria mata, e muito. Mas parece que esqueceram disso durante o pânico, como se só a covid-19 matasse - num país que teve mais de 3,5 mil óbitos por dia no ano passado! Um estudo acadêmico publicado na Lancet concluiu que a cada ponto percentual extra de desemprego, num contexto de recessão, perecem cerca de 30 mil brasileiros num período de cinco anos. É a pandemia da fome!

RODRIGO CONSTANTINO

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