sábado, 25 de abril de 2020


25 DE ABRIL DE 2020
+ ECONOMIA

O futuro do país entrou nos gráficos

Se na manhã de sexta-feira a preocupação no mercado financeiro era a sustentação do governo Bolsonaro sem um de seus principais pilares, o agora ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, no final do dia o temor passou a ser com os rumos do Brasil depois das revelações feitas pelo ex-ministro. No horizonte do mercado financeiro, também se mantém a inquietação com o desgaste imposto ao ministro da Economia, Paulo Guedes.

A bolsa de valores encerrou com queda de 5,45% em um dia no qual a principal referência, a de Nova York, fechou em alta de 1,11%. Portanto, fica claro que o mercado operou com radar voltado para a crise institucional. O risco Brasil medido pelo Credit Default Swap (CDS) subiu acima de 370 pontos, depois de ter iniciado o ano perto de cem. Moro fez acusações de tentativa de interferência do presidente em investigações da Polícia Federal.

- Independentemente se Moro está certo ou não, a atitude do governo foi muito ruim. Em 10 dias, dois ministros importantes foram desligados. Entre os investidores, ficou a sensação de que há ingerência política. É por isso que a bolsa despencou e o dólar disparou. E há preocupações de que possa haver a saída de Guedes, o principal pilar do controle fiscal - observa o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini.

Conforme Agostini, a preocupação do mercado é haver uma guinada na "gestão do governo", porque há uma aproximação com o centrão e mudança na Polícia Federal. O analista também aponta uma troca de protagonismo na economia: o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, tem falado todos os dias em lives variadas, enquanto Guedes se recolhe ao silêncio.

- Moro não é o único pilar do governo, mas o deixa mais vulnerável - avalia Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV (antes Banco Votorantim).

A "resposta" de Bolsonaro veio quando o mercado já havia fechado, mas terá impacto na próxima segunda-feira, projeta André Perfeito, economista-chefe da Necton:

- O mercado vai manter o tom pessimista e, muito provavelmente, segunda-feira será um dia de mais realizações na chave da fuga para a liquidez. O dólar deve se manter em alta testando testar os R$ 6 ao longo da próxima semana.

a nossa parte #juntoscontrao vírus

Randon reforça produção de máscaras

O projeto da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) de produção de máscaras ganhou reforço das Empresas Randon. O grupo vai fabricar duas peças fundamentais para a montagem do equipamento de proteção individual (EPI) que será destinado a profissionais de saúde e segurança que atuam no combate ao coronavírus. Parte da área de injeção plástica da Controil, controlada pela Fras-le, foi adaptada para a produção do suporte frontal de poliamida e de elásticos de termoplástico, usados na montagem dos protetores. Localizada em São Leopoldo (RS), a unidade é a única do grupo com a tecnologia necessária para esse tipo de produção. A adaptação da linha foi feita em parceria com a empresa Imer, de Porto Alegre. As 190 mil peças finalizadas estão sendo doadas para instituições hospitalares e para a Defesa Civil.

claudio frischtak Diretor da consultoria InterB

"O governo está dando tiro no pé do Brasil"

Claudio Frischtak comanda a consultoria InterB, especializada em infraestrutura. Com grande visibilidade internacional, é interlocutor frequente de investidores estrangeiros interessados em aplicar no Brasil. O economista confessa que ainda não terminou de entender o programa de investimentos públicos anunciado pelo governo na quarta-feira e garante que existe muito interesse em investir no Brasil, mas adverte que o "ruído de Brasília" é o maior obstáculo para que a capacidade de atração do país se concretize.

Qual o papel da infraestrutura no plano de reestruturação da economia?

Não está claro o que o governo está propondo. Em infraestrutura, está até um pouco mais claro. O programa como um todo, da forma como foi apresentado, não permite fazer afirmações de caráter peremptório, não se sabe exatamente o que é o programa conceitual, exceto na infraestrutura, que é o que vem se discutindo há mais tempo. O que entendi é que há um programa de investimento em obras públicas de R$ 30 bilhões com ambição de criar 1 milhão de empregos. Há uma relação razoável entre esses números, dependendo da natureza da obra, embora números muito redondos sempre incomodem.



É um bom sinal?


Há um problema básico. Já tivemos, no passado, programas de investimento em obras públicas, e o último foi um desastre. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), gerenciado pela ex-presidente Dilma, representou um desperdício enorme de recursos. O PAC 1 foi ruim, o 2 e o 3, horríveis. Acredito que talvez não seja tão diferente com este. A questão de fundo é que investimento público não funciona bem. A governança é muito ruim, o planejamento é débil. A qualidade dos projetos propriamente ditos deixa a desejar, a obra começa sem projeto executivo e a realização também enfrenta dificuldades. Temos um problema de governança do investimento público.

Em qualquer governo?

Sim, como a governança é frágil, não importa a boa vontade e a integridade do ministro, dos funcionários do ministério ou da direção do Dnit. A economia política é muito perversa, e continua com problema de captura. Ainda mais que, agora, tudo indica que o governo vai fazer aliança com o velho centrão, é um problema adicional. Não vejo como escapar da conclusão do TCU (Tribunal de Contas da União), de que mais de metade das obras do PAC foi paralisada por problemas de planejamento. Outro problema é o tom de emergência, de querer produzir resultados rápidos. Tende a aumentar o volume de problemas, como vimos no caso das obras da Copa e da Olim­píada. As da Copa foram eivadas de corrupção.

Qual seria a alternativa? 

A construção de uma carteira de projetos para licitar ao setor privado. É por isso que continuo não entendendo a natureza do programa. O investidor continua interessado.

O setor privado nacional tem capacidade?

Tem recursos, tem capacidade, tem interesse. O problema é o enorme ruído político que estamos vivendo. Gera grande incerteza, e o o setor privado tem horror a incerteza. E o programa introduz uma variável que não havia antes: o governo que se comprometeu em atrair o setor privado para investir em infraestrutura, que tem uma experiência exitosa de duas décadas, mesmo que tenha havido modelos malucos, como a privatização de aeroportos com 49% da Infraero, também no governo Dilma.

Se o governo estabelecer regras corretas, previsíveis, e apresentar uma carteira de projetos, vai atrair investidores, tanto do setor privado nacional quanto do internacional. Por isso, introduzir um programa de obras públicas hoje confunde mais do que esclarece. Tem espaço para obras públicas, que são aquelas para as quais há projetos executivos de qualidade, análise de custo/ benefício rigorosa, cálculo da taxa social de retorno e que realmente venha a resolver algum problema, desgargalar algum processo. Mas nos nossos cálculos, isso não chega a R$ 5 bilhões, nem perto dos R$ 30 bilhões mencionados.

Haveria interesse mesmo com economia anêmica?

É um complicador, mas converso muito com investidores O interesse em infraestrutura no país é muito elevado, isso é um fato. É claro que, agora, há volatilidade no câmbio, instabilidade. Mas o que afasta os investidores hoje é a incerteza. Quanto mais ruído vier de Brasília, e muito está sendo produzido, pior. Já tivemos problemas enormes na área ambiental, que atrapalharam, diminuíram o interesse. Veio a pandemia. Mudou o foco, mas ninguém esqueceu.

Agora há outro tipo de ruído. O presidente se destaca como um ponto fora da curva na percepção da pandemia. Isso é ruído desnecessário, afeta a imagem do país. E somos nós que estamos criando isso, não os investidores. O governo está dando tiro no pé do Brasil. O populismo, tanto de esquerda quanto de direita, faz muito mal ao país.

Há um ponto positivo no programa, chamado de "ordem"?

Previsibilidade regulatória e segurança jurídica são essenciais. O ordenamento correto é crucial. Mas aí também já tivemos problemas, quando o presidente decidiu ?não taxar o sol?. Não defendo uma posição ou outra, mas isso partir da Presidência é muito ruim.

MARTA SFREDO

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