13 DE MAIO DE 2023
MARCELO RECH
Liberdade e responsabilidade
Mesmo que o Projeto de Lei 2630, o das Fake News, não venha a ser aprovado, ele já deu sua contribuição ao elevar para o topo da agenda nacional o debate sobre a liberdade de expressão. Antes restrito a jornalistas, intelectuais e juristas, o tema se entranhou nas redes sociais e, previsivelmente, tem servido como mola propulsora de mais polarização e desinformação.
Muita gente que se posiciona sobre o PL 2630 embarca em interpretações distorcidas que, impulsionadas por interesses econômicos e partidários, se espalham como fogo em mato seco. Bombardeado, é possível que o projeto naufrague sem que tenha sequer sido lido e compreendido. Em contrapartida, é irônico e surpreendente que alguns saudosistas do regime militar, que institucionalizou a censura à imprensa, a livros, músicas, filmes e novelas, tenham se transformado em paladinos da liberdade sem responsabilidades ou limites morais.
A liberdade de expressão, como toda liberdade, porém, não é absoluta. No Brasil, pode-se opinar pela legalização da maconha ou pelo direito a comprar qualquer tipo de arma. Mas é ilegal incentivar o consumo de drogas ou o uso de armas contra outras pessoas e grupos sociais. Parece uma diferença tênue, mas é o que separa a livre manifestação da incitação ao crime. Outro exemplo: qualquer um pode criticar à vontade a democracia. Mas estimular a ruptura violenta do Estado de direito democrático ou promover a animosidade das Forças Armadas contra outros poderes são violações ao Código Penal. Simples, mas nem todo mundo compreende a distinção.
Os mais sinceros defensores da liberdade de expressão não deveriam se focar na defesa da sua livre manifestação, e sim na daqueles dos quais discordam frontalmente. O princípio iluminista atribuído a Voltaire resume bem o espírito: "Não concordo com uma palavra do que dizes, mas defenderei até a morte o direito de dizê-las". Na prática, significa lutar pelo direito de outros contestarem a sua opinião. Nem todo mundo chega lá, pelo que se vê na agressividade a ideias antagônicas.
Recorde-se, também, o inciso IV do artigo 5 da Constituição, que baliza a liberdade de expressão: "É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato". Ou seja, qualquer cidadão pode dizer o que pensa, mas também pode vir a ser responsabilizado por eventuais abusos, como calúnia, injúria ou difamação. Por meio de contas falsas ou robôs, as redes sociais ganham fortunas com essa clara ilegalidade.
A licença moral para qualquer atividade empresarial pressupõe antes de tudo uma ética responsável. Não pode uma rede de supermercados vender um produto ilegal, clandestino ou estragado, lavar as mãos e dizer que é só uma intermediária, por exemplo. Goste-se ou não, liberdade vem sempre acompanhada de responsabilidade.
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