12 DE MAIO DE 2020
NÍLSON SOUZA
Dependência universal
No começo parecia ridículo alguém usar máscara se não estivesse doente ou trabalhasse na área da saúde. As próprias autoridades disseram, mais de uma vez, que o equipamento de proteção deveria ser restrito a quem realmente necessitasse. A virada foi rápida. Agora, o pano sobre o rosto torna-se obrigatório para proteger o próprio usuário e o próximo. Não há incoerência nisso: estamos aprendendo.
Uso o exemplo da máscara para analisar uma previsão do filósofo alemão Peter Sloterdijk, autor de Crítica da Razão Cínica, que aponta para um mundo mais colaborativo depois da pandemia. Também isso parece incoerente no momento em que governantes de grandes potências acusam-se mutuamente e a guerra por respiradores evidencia o pior do ser humano. Observando-se esses episódios, a tendência parece ser o fechamento de fronteiras e o isolamento. Mesmo isso, na visão do filósofo germânico, pode ser positivo:
- O bem-estar da saúde nacional também ajuda os vizinhos - disse numa entrevista ao jornal El País.
Desenvolvendo: se todos forem cuidadosos com a saúde em seus territórios, estarão contribuindo com os demais. Mais ou menos o que se está descobrindo agora em relação à máscara. Sloterdijk prevê uma espécie de escudo universal (de cuidados com a saúde) que proteja todos os membros da comunidade humana. E prega uma declaração geral de dependência universal.
Será que o vírus exterminador deixará essa lição para os sobreviventes? Espero que sim, embora não me iluda muito. Hoje parece evidente o nosso equívoco de gastar milhões e milhões em armamentos letais, que se tornam inúteis diante de um invasor microscópico. Também parece obviamente insensato acumular riquezas e poderes que nada valem na hora angustiante da falta de ar. Mas o que parece claro hoje tende a se tornar nebuloso amanhã e, muito provavelmente, a desaparecer com a volta da normalidade - seja ela qual for.
Ainda assim, já nem me importo muito se voltaremos a ser os mesmos de antes, bons e maus, sensatos e insensatos, solidários e egoístas, pacifistas e belicistas, democráticos e autoritários. Isso saberemos administrar.
Só quero que esse filme de terror acabe logo!
NÍLSON SOUZA
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