03/06/2017 02h00 - hélio schwarts
Zanone Fraissat/Folhapress | ||
Droga e livre-arbítrio
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Mais opçõesO - Vários leitores escreveram para criticar minha posição contra as internações compulsórias de dependentes de drogas. Para eles, o vício oblitera o livre-arbítrio dos usuários, tornando-os incapazes de tomar as decisões que melhor atendem a seus interesses. Levá-los para uma clínica, mesmo que contra a sua vontade, seria assim não apenas uma possibilidade lógica como também um dever moral. |
Receio que o problema seja mais complexo e nuançado do que pinta essa narrativa. É claro que o dependente tem, em algum grau, sua capacidade para resistir à droga diminuída. Se não tivesse, não estaríamos diante de um quadro patológico. Só que diminuição não é o mesmo que anulação.
A literatura mostra que mesmo pacientes cujo grau de dependência seja classificado como severo ainda conseguem tomar decisões racionais em relação à continuidade do uso da droga.
Vários estudos sugerem que, quando o preço da substância sobe, cresce também a procura por tratamento. Um trabalho australiano de 1997 revelou que dois terços dos viciados em heroína que procuraram o programa de substituição por metadona citaram o preço como uma das razões. Carl Hart, de Columbia, foi ainda mais longe e, manipulando a qualidade da droga oferecida, fez com que dependentes trocassem doses "ruins" por uma recompensa futura. Se o bolso e a pureza pesam nesse tipo de decisão, é razoável supor que outros circuitos cerebrais também possam influir.
É justamente aí que se abre uma janela para a atuação do poder público. Se houver níveis razoáveis de confiança entre os pacientes e as equipes de saúde, elas têm uma boa chance de convencê-los a aceitar o tratamento, hipótese em que o prognóstico melhora significativamente. O problema de ações destrambelhadas como a da prefeitura é que elas acabam com qualquer confiança que possa existir.
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