quarta-feira, 17 de outubro de 2018



17 DE OUTUBRO DE 2018
FÁBIO PRIKLADNICKI

SEGUIMOS FAZENDO ARTE


Os profissionais que trabalham com jornalismo cultural são algumas das pessoas mais bem informadas sobre a agenda da cidade. Sempre que algum conhecido reclama que não há nada para se fazer, temos na ponta da língua uma série de espetáculos, shows, filmes e exposições para recomendar. É o nosso ofício: recebemos inúmeros materiais de divulgação e vamos atrás de informações.

Em um país que vive um dos momentos de maior incerteza sobre seu futuro político, com uma corrida eleitoral marcada pelo ódio, pelo medo e pela ruptura, chega a ser positivamente surpreendente ver que a cultura ainda vibra. Um detalhe tem chamado a atenção. Recentemente, alguns materiais de divulgação têm sido distribuídos com frases de resistência, como "Seguimos fazendo arte" ou "Apesar de tudo, seguimos trabalhando". Talvez estejam dizendo isso para os jornalistas, talvez para o público, talvez para eles mesmos - ou para todo mundo. Seja como for, esse gesto me comove.

Quem vibra com a cultura entende perfeitamente. Ela costuma ser um termômetro da saúde de uma nação. Quando as coisas vão bem, a cultura também vai. Quando a produção artística começa a sofrer ataques ou censura, é sinal de que a situação está indo ladeira abaixo. As dificuldades do setor têm acompanhado a crise no país. Primeiro, foram as torneiras de financiamento que começaram a secar. Depois, vieram os ataques aos mecanismos públicos de incentivo. E, então, as intimidações de quem odeia arte, coexistência e diversidade.

Hoje, o pensamento crítico está em uma situação complicada: tenta-se argumentar em um momento no qual o ódio torna o diálogo difícil, para não dizer impossível. Pois o debate não está mais no nível racional. Sim, a arte também trabalha com a emoção (jamais com o ódio), mas depois há um momento de reflexão, elaboração, pensamento. Tenta-se chegar a um entendimento.

Quando alguém esbraveja que não temos tempo ou recursos para promover a cultura porque há problemas mais graves no país, isso já é um sintoma de que não estamos encaminhando uma solução para esses problemas. Quem consome cultura adquire um entendimento mais profundo sobre o mundo. E, sobretudo, aprende a não repetir os erros do passado.

FÁBIO PRIKLADNICKI

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