25 DE MAIO DE 2019
LYA LUFT
Livro é filho?
Talvez eu não pareça simpática, mas, no meu caso, a resposta é não.
Filho, para mim, tem algo de tão transcendente e vital ao mesmo tempo, toma conta tão visceralmente de mim, eu toda, que nenhuma obra de arte que eu pudesse produzir se aproximaria dessa sensação. Nem livro, nem música, nem pintura, nem dança, nem nada. Eu não morreria por nenhum de meus livros: morreria, sim, por cada um dos meus filhos, e, hoje, cada um de meus sete netos e netas. Pois são parte da minha vida: essa história de carne da minha carne, sangue do meu sangue, tem proporções ainda maiores: alma da minha alma.
Sim, eu tendo a ser mãe desmesurada, já me disseram que minha verdadeira vocação nem é escritora, mas galinha choca. Imagino que minha razoável dose de bom senso não os tenha superprotegido, pois todos têm suas vidas, casamento, profissão, escolhas, bem determinadas e diferentes: médica, agrônomo, filósofo. Não fiz os temas por eles, não os protegi nem controlei neuroticamente, e, quando preciso, botei limites. Algumas vezes - me arrependo sim - perdendo a cabeça quando a zoeira era demais, e afinal mãe, tradutora, professora, motorista da família, está sempre à beira... não de um ataque de nervos, mas de romper as cordas da paciência. Preocupação, ansiedade (sou ansiosa, sim), mas enormes alegrias, orgulho, parceria, eventuais dissenções - que família não é santidade -, mas uma vida sem eles eu jamais imaginaria nem quereria ter.
Sim, o destino levou um deles, o do meio, com seu sorriso fascinante, seus prodigiosos olhos azuis, sua bondade, alegria, energia incrível, mas afinal ele continua aqui, conosco que o amamos tanto.
E os livros? Os livros não são filhos meus: são produtos. Do meu trabalho e do meu prazer, de algum dom que eu tenha, da imaginação, do conhecimento da língua, de habilidade em escrever depois de tantos e tantos anos, sobretudo lendo e traduzindo loucamente - melhor exercício para aprender qualquer idioma.
Mas, claro, tenho imenso cuidado com cada um deles. Em cada livro, cada página, sempre coloquei o melhor que podia... naquele momento, depois de reescrever, reler, rearrumar, muitas vezes. Mesmo assim, se por acaso releio (em geral se me pedem uma palestra sobre), encontro coisas que hoje talvez escrevesse melhor... ou algumas que me fazem balançar a cabeça afirmativamente, essa você acertou, guria.
É assim. É isso. Meus amados livros, meus amados produtos, acabam de aumentar com um novato que está na minha editora, a Record, para sair possivelmente no segundo semestre. O já anunciado As Coisas Humanas, reunião de textos avulsos, reflexões, poucas crônicas reescritas, retoma, enfim, aquelas conversas no ouvido do leitor, que me fazem tanto bem. Gostem dele, quando aparecer.
(Se não gostarem, não me digam.)
LYA LUFT
Nenhum comentário:
Postar um comentário