13 DE ABRIL DE 2019
EDUCAÇÃO
Ministra polemiza em fala sobre ensino domiciliar
ESPECIALISTAS REPERCUTEM DECLARAÇÕES de Damares Alves sobre pais de crianças autistas ou com deficiência preferirem educar os filhos em casa
As declarações da ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, defendendo o ensino domiciliar para crianças autistas ou com deficiência reacendeu o debate sobre esse método educacional. Em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade, na sexta-feira, Damares afirmou que muitos pais entendem que os filhos não estão se adaptando às escolas, e que a melhor solução seria estudar em casa. Ela citou dados de que, hoje no Brasil, mais de 20 mil famílias aplicam a modalidade, mas de maneira irregular.
- Pais das crianças com deficiência, pais de crianças com autismo... É um grupo muito grande que tem conversado com esse ministério. Eles gostariam de educar os filhos em casa. Muitos entendem que os filhos não estão se adaptando na escola. Tem criança com autismo que sofre mais indo para a escola do que ficando em casa - disse.
A educação domiciliar foi definida como uma das prioridades do governo Bolsonaro nos cem primeiros dias de gestão. O entendimento é de que é preciso regulamentar o chamado homeschooling depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) barrou a prática por não haver legislação específica.
Na avaliação da assistente social Patrícia Bittencourt dos Santos, gestora do serviço social da Associação Canoense de Deficientes Físicos (Acadef), a presença das crianças com deficiência em escolas é uma conquista histórica em prol da inclusão, e elaborar políticas que as afastem dessas instituições poderá ser um retrocesso:
- Não podemos olhar a questão educacional apenas sob o ponto de vista da saúde, de que haverá dificuldade para deslocamento ou permanência na escola. As pessoas com deficiência têm direito ao aprendizado, ao lazer e à convivência, no que o ambiente escolar é essencial.
SOCIALIZAÇÃO X FALTA DE ESTRUTURA DAS ESCOLAS
Na entrevista à Rádio Gaúcha, a ministra criticou o argumento de que a falta de socialização é um dos maiores problemas do ensino domiciliar. Para ela, essa socialização não ocorre apenas na escola, pode ser feita em cursinhos de inglês, em igrejas ou na rua onde a família mora, por exemplo.
Especialista em Educação Inclusiva e doutoranda em Educação pela Unisinos, Deise Andréia Enzweiler discorda:
- O ponto de vista da ministra tem alguns equívocos de compreensão da teoria educacional. É na escola onde a criança avança em sua formação humana. Se a convivência for feita apenas na família, na vizinhança ou na igreja, ela não vai aprender a lidar com as diferenças de opinião, raça e religião.
Deise concorda que as escolas carecem de melhor estrutura para atender pessoas com deficiência e avalia que faltam profissionais com qualificação para lidar com autistas. Mas, em comparação com o ensino em casa, ainda é a melhor alternativa, em razão da falta de tempo e preparo dos pais para repassarem o conteúdo escolar e pedagógico aos filhos.
Mãe de um menino autista de 10 anos, Sandra dos Santos Andrade, pós-doutora em educação e professora da Faculdade de Educação da UFRGS, avalia que o ensino domiciliar pode ser, sim, uma alternativa para casos de autismo. Menos por desejo dos pais e mais por necessidade. O filho dela hoje recebe educação domiciliar, com o suporte de profissionais de diversas áreas, como psicopedagogo, psiquiatra, neurologista, psicomotricista e professora.
- Nosso desejo é que ele estivesse no ambiente escolar, até porque isso entraria na ordem da normalidade e da inclusão. Mas, de modo geral, não temos escolas efetivamente preparadas para darem conta do atendimento a jovens com autismo ou síndrome de Down, por exemplo, e isso agrava sua dificuldade de aprendizagem.
A favor de um caminho legal para o ensino domiciliar, ela pondera que uma mudança nessa direção precisaria ser muito bem estruturada. Caso contrário, só estaria ao alcance do público elitizado.
ERIK FARINA E MARCEL HARTMANN
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