sexta-feira, 19 de abril de 2019


Jaime Cimenti 


Surto coletivo sombrio 

A execução de 14 mulheres, cinco homens e dois cachorros na baía de Massachusetts, em 1692, todos acusados de bruxaria, que se deu pelo desencadeamento de um surto coletivo sombrio, é inesquecível. O fato se deu em meio às tensões da vida colonial e sob o obscurantismo religioso presente na puritana aldeia de Salem e é, sem dúvida, um dos capítulos mais distópicos do passado norte-americano. A tragédia deve ser sempre lembrada e todos esperam que não se repita. A feitiçaria se materializou em janeiro, o primeiro enforcamento ocorreu em junho e tudo terminou em setembro. 

Depois dos julgamentos, fez-se um silêncio crivado de culpa. A partir de tal fato e com base em meticulosas pesquisas históricas, a grande escritora e jornalista norte-americana Stacy Smith, autora do best-seller Cléopatra: uma biografia (Zahar, 2011) e do romance Vera (Mrs. Vladimir Nabokov), que ganhou o Pulitzer em 2000, lançou no Brasil, pela Zahar, As Bruxas (324 páginas, tradução de José Rubens Siqueira. O New York Times o considerou como o primeiro grande livro de não ficção sobre o tema em décadas. Stacy é uma das mais aclamadas autoras norte-americanas da atualidade. 

O New York Times não exagerou. O fantástico thriller psicológico, opressivo e forense vai fundo sobre o drama que marcou o século XVII. Intriga, traição e histeria na aldeia deixaram perplexos os habitantes. Vizinhos acusavam vizinhos, maridos acusavam esposas, pais e filhos acusavam perniciosamente uns aos outros. Q

uem merecia a morte por ter ligação com Satã? Os acusados foram muitos, as testemunhas confundiam seus algozes e, ao fim da histeria, dezenove pessoas foram enforcadas por prática de bruxaria. Com precisão histórica e prosa vibrante a obra mostra as cores, as texturas e as inquietações daquele tempo. Salas de tribunal, ruas, igrejas, fazendas, tavernas e prisões foram palcos para um emaranhado de encantamento, raiva e tragédia. Em nossa época de redes sociais, inimigos invisíveis e intolerância às diferenças, esta história indelével faz mais sentido do que nunca. Estão na narrativa, principalmente, as exigências de uma fé rigorosa e as agruras da Nova Inglaterra puritana. 

O livro confirma o talento e a fama da autora, que já recebeu os prêmios George Washington Book Prize e o Ambassador Book Award e colabora com a revista The New Yorker e com os jornais The New York Times e Washington Post. Jornalismo, jornalistas Dia 7 de abril foi comemorado o Dia do Jornalista. Em 7 de abril de 1831 Dom Pedro I abdicou em favor de seu filho, D. Pedro de Alcântara, futuro D. Pedro II. Em 20 de novembro de 1830 fora assassinado o jornalista Giovanni Libero Badaró, que defendia a liberdade de imprensa, criou o jornal Observador Constitucional e opunha-se à Monarquia reinante no País. 

A revolta popular contra o assassinato do jornalista foi um dos fatores que levaram Dom Pedro I a abdicar. A Associação Brasileira de Imprensa - ABI foi fundada em 7 de abril de 1908 e em 1931 instituiu esta mesma data como sendo o Dia do Jornalista. O fato, assim como também Watergate e a queda de Nixon, mostram o grande poder da imprensa livre, que uns chamam de Quarto Poder. Claro que o imenso poder sempre deve estar acompanhado de alta responsabilidade social, amor aos fatos e à verdade (seja ela qual for). 

Nesse momento de divisões, fake news e quando cada cidadão é seu próprio editor, como previu MacLuhan, mais do que nunca os jornais e os jornalistas devem procurar seguir os pilares do jornalismo, como a liberdade, a pluralidade, a busca da verdade, a objetividade e o desejo de prestar um bom serviço à sociedade. Qualquer violência a jornais ou jornalistas deve ser denunciada e punida, pois nesse caso é como se a sociedade e seu direito à informação tivessem sido violados. Uns exagerados andam dizendo que com os meios de comunicação atuais os jornalistas seriam dispensáveis. Absurdo. 

Quem vai fazer o trabalho fundamental de filtrar as notícias, checar as fontes, analisar, comentar, criticar e comentar os fatos? Se alguns jornalistas e jornais exageram ou praticam jornalismo questionável, aí mesmo é que a imprensa é importante para denunciar e criticar a própria atividade. Jornalistas não devem se considerar heróis, papais sabe-tudo e devem deixar a arrogância de lado, até pelo respeito à democracia e ao público. 

Antigamente jornal e jornalista não eram notícia. Hoje alguns entrevistadores querem superar o entrevistado e muitos praticam com exagero o tenebroso shownalismo. Evidente que hoje, em tempos de tantas divisões, brigas, egos oceânicos, vaidades e histerias de porte amazônico, mais do que nunca é difícil ser jornalista e praticar bem a profissão. 

Mas é preciso ter fé e esperança, ouvir os quinze lados envolvidos, pesquisar as montanhas de informações das mídias eletrônicas e fazer o melhor possível. Elogiar na segunda-feira, criticar na terça, ficar quieto na quarta e procurar distribuir com equilíbrio elogios e críticas a tudo e todos pode ser um bom caminho. Jornalista não precisa ser sempre do contra ou sempre a favor e, na medida do possível, não deve trabalhar limitado por crenças religiosas, partidárias, ideológicas ou outras. 

Quanto mais liberdade melhor, embora a gente saiba muito bem que as pessoas adoram jornalistas que falam bem delas e odeiam os que as criticam. Faz parte, demasiado humano. Às vezes, The price of sucess is the press... Lady Diana, por exemplo, adorava brincar de gato e rato com os jornalistas, e o público curtia. - 

Jornal do Comércio (https://www.jornaldocomercio.com/_conteudo/colunas/livros/2019/04/678922-surto-coletivo-sombrio.html)

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