06 DE ABRIL DE 2019
CARPINEJAR
Coisas do nosso Interior
O interior gaúcho tem uma particularidade maravilhosa para mandar o outro às favas. Não é mandando às favas. É uma expressão irônica que pretende dizer o contrário do que significa.
- Passar bem!
Quando escutar o passar bem não se trata de uma recomendação carinhosa, afável, protetiva, como aparenta a princípio, porém expressa uma inconformidade incurável, a paciência já extrapolou os limites.
Passar bem é um modo polido de xingar, um modo educado de exorcizar alguma figura da frente. É mandar embora. É atestar a chatice extrema. É desabafar que não se aguenta mais. É desejar que alguém se ferre bonito, que se dê mal.
Costuma servir de fecho de uma conversa, para forçar a saída de um assunto desagradável e ainda para mostrar uma inconformidade com a solução apresentada.
Em cidades interioranas, não há juiz que não recebeu um passar bem de um réu condenado, não há médico que não ouviu o passar bem quando o paciente não foi atendido em pedido de atestado médico de uma semana, não há prefeito que não tenha engolido um passar bem de um eleitor insatisfeito.
Pode acontecer dentro da família. Quando o pai ou a mãe não suportam mais a teimosia do filho. Eu já escutei a frase. A princípio, jurei que havia vencido a discussão, até me dar conta do seu fundo sarcástico.
O passar bem é o equivalente a "eu desejo o seu melhor só que não". Traz uma vontade latente para que o interlocutor quebre a cara no final das contas e depois venha pedir desculpa, com o rabo abanando.
Quem o profere não compra briga, diretamente, deixa o veneno, nas entrelinhas. Tem um quê de respeito, já que não é um palavrão. Mas também apresenta a malandragem de ofender sem ofender. Ninguém pode ser acusado de calúnia com a sua utilização cínica. É um recurso inteligente para despistar a raiva e o ódio. É bater com o travesseiro da língua. Não deixa marcas, somente o mal-estar.
Quando um morador do nosso interior gosta de você sempre colocará Deus no meio. É ficar com Deus ou ir com Deus a toda hora. Até os ateus adotam essa formalidade.
Despedida que é bênção sugere acolhimento. Daí não tem erro, não precisa temer o vodu.
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