RUTH DE AQUINO
02/10/2015 - 21h38 - Atualizado 02/10/2015 21h38
Perdidos no espaço
Dilma desperdiçou o esforço de cooptação, pois Eduardo Cunha foi atingido pelas últimas denúncias
Em aventuras que misturam comédia e ficção científica, a tripulação da nave Brasília luta às cegas para encontrar o caminho de volta para casa e o poder eterno. O Professor Lula, sua companheira Dilma e seus pupilos Wagner, Mercadante e Renan são atacados pelo Doutor Eduardo Cunha, agente inimigo, que tem uma obsessão: sabotar a missão de Lula, Dilma, filhos e afilhados no planeta vermelho.
Cunha é tão desastrado e abilolado que embarca na mesma nave que a família. Não estava preparado para a revolta do robô humanoide, que escapa ao controle de todos e destrói o sistema de navegação da nave Brasília. Estão todos agora perdidos no espaço – mas com contas milionárias, em dólar, em alguma parte da Terra.
O seriado se passa no presente, já teve várias temporadas e se arrasta em capítulos inverossímeis, sob o comando do Professor, o grande timoneiro. A viagem começou com objetivos grandiosos e idealistas. A família embarcou com a missão de encontrar uma alternativa para a supercorrupção política no Planalto. Mas foram desmascarados. Só queriam salvar sua pele, mancomunados em objetivos a anos-luz do bem comum.
A primeira temporada, em preto e branco, tinha embasamento ideológico e apresentava o Doutor Cunha como um espião inimigo, que se revelou perigoso e imprevisível. Na segunda temporada, com ênfase na comédia, as aventuras tornam-se mais absurdas, recheadas de alienígenas birutas (não dá para citar todos aqui, o Congresso brasileiro é um dos maiores do mundo). E a série passa a ser em cores e ao vivo. Na temporada atual, os vilões se alternam no destaque. Não há previsão de fim. Todos podem ser destruídos, especialmente quem não embarcou na nave-mãe e está, hoje, na fila do seguro-desemprego, da escola ou do hospital.
Pressionada pelo Professor, Dilma age em favor de tripulantes que só querem saber de continuar a voar na primeira classe. A troca na poltrona premium da Educação é a mais grave. Sai o filósofo e professor universitário Renato Janine Ribeiro – aplaudido ao sentar ali há poucos meses – e entra quem? Aloizio Mercadante, o “quadro” de Dilma, um quadro desbotado, um economista que pouco fez pela Educação quando foi ministro da Pasta.
Em 2009, Mercadante afirmou, em discurso, que deixaria de ser líder do PT no Senado. Protestava contra o PT, por arquivar investigação da Comissão de Ética contra José Sarney. Após uma noite de conversa com o Professor Lula, voltou atrás. Tudo gogó. O “quadro Mercadante” pode ser pendurado em qualquer parede. Curioso é ele substituir Janine, que declarou ser “assustador” o nível da má alfabetização no Brasil. Mercadante é o terceiro ministro da Educação em dez meses. Leia de novo a última frase.
Outro expulso da nave foi o ministro da Saúde, Arthur Chioro, que cedeu seu assento ao PMDB (Partido Master da Dilma Bolada). O escolhido foi Marcelo Castro, do Piauí, cujo mérito na Saúde é ter como padrinho Leonardo Picciani, líder do PMDB na Câmara. O demitido, Chioro, teve, como Janine, seu momento de sincericídio dias antes. Afirmou que o SUS – Sistema Único de Saúde –, por falta de dinheiro, entrará em colapso em setembro de 2016.
Afinal, por que nos preocupamos com Educação e Saúde num país com tantos analfabetos e semianalfabetos, doentes desassistidos, hospitais em calamidade pública? Por quê? Se o grande timoneiro conseguiu colocar no comando da nave civil o baiano Jaques Wagner, para evitar pedaladas que derrubem a nave Brasília, não precisamos nos preocupar. Wagner sai do Ministério da Defesa para defender Dilma.
Ao menos, quem dá valor à Ciência e Tecnologia pode comemorar! Porque a poltrona, estratégica num país em desenvolvimento, será ocupada por um deputado pau-mandado do espião Cunha, Celso Pansera. Você conhece o Pansera. Lembra aquele episódio do seriado em que o doleiro delator Alberto Youssef acusa Pansera de ameaçar a ele e a sua família para obrigá-lo a calar a boca? Esse mesmo. Grande companheira Dilma.
Ela desperdiçou o esforço de cooptação, pois Cunha parece ter sido atingido pelas últimas denúncias. O “bastião da moralidade” da Câmara, que promove cultos evangélicos na nave Brasília, tem, segundo o Ministério Público da Suíça, US$ 5 milhões em contas bancárias no país europeu com a mulher, Cláudia Cruz, e uma das filhas. Em depoimento à CPI da Petrobras, em março, negou a conta.
O nariz das autoridades máximas no Brasil cresce na mesma proporção em que nosso queixo cai. De episódio em episódio, aumenta a sensação de que somos nós os perdidos no espaço e que o filme em exibição é um apanhado verídico de relatos selvagens. Em vez de rir ou chorar, é hora de agir e protestar.
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