03 de outubro de 2015 | N° 18313
DAVID COIMBRA
Aí vem o furacão
O furacão Joaquim vem vindo. Está a caminho, desloca-se com a previsível velocidade do vento, subindo o litoral a partir das Bahamas. A chegada dele a Boston está prevista para terça-feira. Dizem que estará mais calmo, mas ainda assim é um furacão. Há que se respeitar.
Pense num leão de circo. Um velho leão de circo, desdentado, de juba rota e olhar cansado. Você entrará na jaula dele? Não. Não entrará. Você terá medo. Porque um leão sempre será um leão.
Um furacão desanimado também é um furacão, e por isso causa expectativa a irrupção iminente de Joaquim.
Nunca antes vi um furacão em pessoa, só em fotos e filmes. No ano passado, na véspera do 4 de julho, dia da independência americana, passou pelo litoral de Nova York um furacão chamado Arthur, e um resto dele deu uma chicotada aqui em Boston, pegando-me desprevenido, na rua.
Esses eventos climáticos dificilmente pegam os americanos desprevenidos. Quando vai ocorrer alguma intempérie importante, eles interrompem os programas da TV para dar alertas e mandam mensagem para a gente pelo celular. Como é que eles têm o meu número, isso não sei, só sei que, no dia em que ia desabar uma tempestade de neve, a Defesa Civil me ligou.
– O senhor já comprou lanternas? Tem lanternas em casa? – perguntou-me o cara com voz aflita.
Respondi que não. Ele ficou mais nervoso: – Compre lanternas! Compre lanternas! Pode faltar energia! Compre lanternas!
Por mil Thomas Edisons! Saí correndo à procura das lanternas. Não encontrava em nenhum lugar. Todo mundo havia comprado lanterna na cidade. Numa ferragem pequena, achei as últimas três da região. Comprei-as. Ainda não as usei. Não faltou luz na tempestade nem depois dela.
Mas a chibatada do Arthur atingiu-me em cheio. Em um segundo, foi como se uma caixa-d’água cheia tivesse sido despejada na minha cabeça.
De assustar. Mesmo assim, a chance de observar um furacão me deixa curioso. A natureza em ação é coisa bonita de se ver.
Durante a Copa de 2002, no Japão, fomos para uma região em que ocorrem terremotos todos os dias. Fiquei encantado com a possibilidade de testemunhar um terremoto e disse isso para os jornalistas próximos. O Luis Fernando Verissimo era um deles. Ele me olhou com os olhos arregalados e sussurrou:
– Não, não... Percebi que o medo dele era genuíno.
Compreendo o Verissimo. Também não sou de me arriscar em vão. O que queria era um terremotinho que balançasse os lustres, mas não fizesse mal a ninguém. Acabou sendo um “inho” mesmo. À noite, a cama deu uma tremida. Assim: br. Nem percebi. Pensei que fosse o trem passando. No dia seguinte é que me disseram que era um terremoto. Uma decepção.
O fato é que ainda somos surpreendidos, assolados e flagelados pelos eventos mais comuns do clima, como a chuva, o vento, o frio ou o calor. Não é por outro motivo que, se você falar do tempo, pode falar com qualquer pessoa, em qualquer parte do mundo. Nossa história debaixo do sol é, basicamente, a luta não tanto pela derrota, mas pelo controle da natureza.
E estamos fazendo avanços. Li que, em cinco anos, a Nasa vai lançar um foguete que desviará meteoros da Terra. Se a Nasa tivesse feito isso 65 milhões de anos atrás, ainda teríamos dinossauros andando por aqui. Não sei se seria boa ideia. O jeito é confiar na natureza, mas com alguma desconfiança, como quem olha um velho leão de circo. Sabe-se lá... Que venha o Joaquim!
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