05 DE DEZEMBRO DE 2022
PINIÃO DA RBS
A CRISE DOS PARTIDOS
É relativamente comum deparar em conversas informais com cidadãos declarando que votam na pessoa, e não no partido. A afirmativa é um sintoma da crise de representação das siglas no país e do fortalecimento do caráter personalista da política brasileira. Eleitores se consideram mais identificados com a postura e as posições de um determinado candidato e menos vinculados ao que seria o ideal de determinada legenda, idealmente com uma linha programática preestabelecida e amplamente conhecida.
Essa característica, na verdade, revela uma fragilidade da democracia no país e se mostrou mais uma vez na última eleição presidencial. Os dois concorrentes do segundo turno, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), em maior ou menor grau, mostraram ser muito maiores do que seus partidos, como descreveu reportagem de Carlos Rollsing publicada no caderno DOC da superedição de Zero Hora.
O fato é que o país viveu, há até pouco tempo, um período de grande fragmentação partidária. Criar uma sigla, por mais nanica que fosse, tornou-se um empreendimento rentável para seus dirigentes, que passavam a manejar recursos públicos e, depois, a convertiam em um balcão de negócios a alimentar o toma lá dá cá que dificulta a governabilidade.
Outras legendas históricas, desfiguradas e tomadas por oportunistas, passam longe de honrar o significado de seus nomes de batismo. Com tamanho descrédito, potencializado por escândalos de corrupção, seria natural que a grande maioria dos eleitores deixasse de se sentir representada pelas agremiações políticas. Ao fim, mesmo siglas que pareciam emergentes por tentarem ter a coerência ideológica como substrato para se consolidar no tabuleiro político nacional acabaram tragadas pela polarização.
Uma esperança de início de reversão do quadro ocorreu com a proibição das coligações nas eleições proporcionais. A cláusula de barreira também tem papel importante, ao negar a partidos que não conseguem um mínimo de votos válidos acesso aos recursos do fundo partidário e tempo na propaganda eleitoral. É um mecanismo que acaba incentivando fusões e incorporações, diminuindo a fragmentação partidária.
Quatro anos atrás, 30 legendas elegeram representantes na Câmara dos Deputados. Agora, foram 19. É um número elevado ainda. Afinal, não existem tantas linhas distintas de pensamento. Mas a tendência é de que a agregação continue, emprestando mais racionalidade ao jogo político. Ainda há pontos que podem ser mais discutidos, como a possibilidade de alterar o modelo atual de lista aberta e nominal, que estimula o individualismo, para o sistema distrital, puro ou misto.
Resta claro que a esmagadora maioria dos partidos perdeu a capacidade de ser um polo aglutinador de eleitores em torno de uma doutrina. A comunicação digital na era das redes sociais, por sua vez, potencializou o alcance de candidatos que pouco dependem de siglas consolidadas para levar a sua mensagem aos cidadãos. Mas parece evidente que o estado atual causou distorções que nutriram o fisiologismo e minaram a capacidade de governos formarem bases sólidas em torno apenas de projetos.
Em nome da saúde da democracia brasileira, o ideal seria que o número de partidos continuasse a cair, aglutinando de forma mais aguda políticos e eleitores que comungam de visões de mundo semelhantes. Dessa forma, as legendas poderão voltar a expressar melhor a vontade e as convicções dos diferentes segmentos da sociedade, melhorando a qualidade da representação e permitindo o amadurecimento do debate, norteado pelos princípios republicanos.
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