01 de outubro de 2015 | N° 18311
DAVID COIMBRA
O nude do Stênio
Vi as fotos do Stênio Garcia sem roupa na internet. As pessoas disseram que ele “fez um nude”.
Gosto desse eufemismo. Nude. Antes as pessoas ficavam peladas, o que é desagradável. Uma pessoa pelada anda por aí balançando suas partes, ela não se preocupa com a assistência, ela não quer provocar ninguém nem mostrar um belo corpo, não: ela está pelada como um bicho. Um bicho não fica pelado, ele está sempre pelado. Seu estado natural é ser pelado, o estranho é ver um bicho vestido. Assim é um ser humano pelado. Um bicho.
Já um ser humano “nu” é diferente. “Nu” é mais divertido. “Nua”, mais ainda. Se você escrever “Ela estava nua. Completamente nua”, se você escrever isso, escreverá sussurrado, rouco, escreverá com os olhos semicerrados e a boca entreaberta. Ou, pelo menos, será lido assim.
E você pode melhorar o texto, vamos lá:
“Ela acordou completamente nua, numa cama estranha”.
Uh! Temos uma história aqui! Garanto que você quer continuar. Tipo: “Depois de alguns segundos de perplexidade, ela se sentou no colchão. Olhou em volta. Não conhecia aquele quarto. Não se lembrava de nada da noite anterior. Caminhou, sentindo nos pequenos pés descalços a maciez de um tapete tão alto, que seria capaz de esconder as vergonhas mais inconfessáveis. Deslizou até a grande janela. Abriu a cortina. E viu o Empire State. Estava num apartamento suntuoso, em um andar elevadíssimo de um arranha-céu de Manhattan”.
Ah, que bela história nós contaríamos sobre essa mulher completamente nua que acordou numa cama estranha! Mas estamos aqui para falar do Stênio Garcia pelado, que fazer? É o assunto do dia...
Como havia dito, tenho a maior simpatia por essa palavra, “nude”. Você não fica nude. Você “faz” nude. É algo artístico, até. É uma obra. E é muito delicado, muito polido, como diriam os americanos. Porque, se você fizer um nude, algum crítico pode olhar e dizer:
– Não gostei muito deste seu nude.
E tudo bem! Ele não está chamando você de bagulho, não está dizendo que você anda fora de forma nem nada. Você pode ir lá e mudar a coisa, pode fazer outro nude. Pelo menos é essa a impressão que passa, e é isso que importa.
O nude do Stênio Garcia, por exemplo. Vi dois: o de ladinho e o de frente. O de frente não aprovei muito, e digo isso não como crítica à condição física do Stênio, que, aos 83 anos, está ó-ti-mo, mas como analista de nudes. Não aprovei porque ele parece desanimado, está com os braços largados ao longo do corpo, olhando para a câmera com resignação, como se dissesse para a esposa, ao lado: “Está bem, vamos fazer esse nude...”
Não! Um nude não pode ser feito com reticências. Tem de ser feito com exclamação. Ou até com uma interrogação insinuante: hmm? Mas nunca assim, como fez o Stênio no seu nude frontal, onde ele parece estar apenas pelado.
O de ladinho, sim. O de ladinho é um bom nude. Stênio cuida da silhueta, encolhe a barriga e... sensualiza... Aliás, sensualizar é outro verbo de que gosto. Inclusive... mas vamos deixar esse assunto para outro dia, pensar no Stênio pelado me esgotou a verve.
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