domingo, 9 de abril de 2023


Fabrício Carpinejar 

Lição da vida

Quando entregara o convite com o meu endereço, cada um dos meus colegas havia confirmado a presença, agradecendo a lembrança com um sorriso. E, nas minhas costas, planejaram uma conspiração de ausências

Em minha primeira festa de aniversário organizada para os amigos, não veio ninguém. Eu tinha oito anos e era um feriado. Chamei os colegas da escola e nenhum deles apareceu. Fiquei esperando no portão das 16h até anoitecer. Morávamos numa esquina. Todo mundo que dobrava a rua acelerava meu batimento cardíaco, podia ser um convidado.

Estava estreando botas ortopédicas e um macacão branco. Com a lua e as estrelas já despontando no céu, desisti da minha vigília, percebi que não existiria reciprocidade fora de mim. Engoli o choro, tinha gosto de gripe.

Não conseguia levantar o meu olhar, que se tornou pesado pela vergonha de não ser amado. Arrasado, via-me excluído das minhas relações mais próximas, desprestigiado, vítima de um bullying silencioso.

Minha esperança foi torturada. Não duvidava de que a turma havia combinado o boicote coletivamente, só para que eu sonhasse alto com as expectativas da casa cheia e, consequentemente, sofresse mais com a queda e as cadeiras vagas ao redor da mesa.

Quando entregara o convite com o meu endereço, cada um dos meus colegas havia confirmado a presença, agradecendo a lembrança com um sorriso. E, nas minhas costas, planejaram uma conspiração de ausências.

O gesto de protesto me dizia claramente que eu não merecia atenção ou destaque nem na data de meu nascimento, que minha aparência não inspirava credibilidade. Que eu deveria recolher a minha insignificância de menino feio e desengonçado, cheio de apelidos, sem companhia para fazer trabalho em grupo. Eu sabia que entraria na sala de aula na manhã seguinte com o pessoal rindo sussurrado do meu vexame. Minha dor ainda se encontrava no seu primeiro capítulo.

Mas, ao voltar para dentro da residência, emburrado, eu vi a minha mãe tão desolada que esqueci o meu sofrimento. Afinal, ela passou noites em claro preparando os docinhos e salgadinhos para atender à criançada. Na véspera, seu maior medo era que as bandejas não fossem suficientes para o tanto de gente. 

Eu a abracei e falei: Arrasado, via-me excluído das minhas relações mais próximas, desprestigiado, vítima de um bullying silencioso. — Não fique assim, mãe, podemos congelar a torta para o ano que vem. Você cura a sua tristeza quando se preocupa com a tristeza do outro. É o princípio da volta por cima.

Sua tristeza deixa sua natureza egoísta, ensimesmada, e assume uma condição inesperadamente gentil, cordial, olhando para as lágrimas ao lado. Mesmo acabrunhado, você se sente capaz de confortar as dores de quem gosta. E seguir adiante. E não se abater por uma situação adversa.

Em vez de se acreditar isolado, isolar a mágoa. Entender que seu pesar não é exclusivo, muito menos incomum. Que haverá dias ruins e bons, e nenhum deles será definitivo. Pois, na verdade, você jamais sofre sozinho. A família sempre sofrerá com você. Naquele momento, eu envelheci um ano e amadureci bem mais do que isso.

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