segunda-feira, 27 de janeiro de 2020



27 DE JANEIRO DE 2020
HUMBERTO TREZZI

Os argentinos e os chatos nas estradas

Neste verão já teve quase de tudo no litoral gaúcho. Baleia encalhada em Tramandaí, tubarão com dentes à mostra em Imbé - para provar que nem só de mães-d´água vive o monstruário submarino - e até águas cristalinas e esverdeadas no reduto do mar "chocolatão", Cidreira.

Faltava um clássico, como reparou o colega Fábio Schaffner: argentino abandonado à beira da estrada. Não falta mais. Uma correntina foi esquecida pela família num posto de gasolina em Entre-Ijuís, região das Missões, na madrugada de quinta-feira (23). Ela só sabia informar que os fujões tripulavam um Peugeot vermelho. Coube mais uma vez à Polícia Rodoviária Federal (PRF) localizar os responsáveis pelo abandono e convencê-los a retornar. Como se os policiais não tivessem nada mais a fazer além de servir de babá dos hermanos... Os ocupantes do carro chegaram a dizer que não tinham esquecido ninguém (Pode???), mas depois se arrependeram, voltaram e resgataram a caroneira.

Poderia ser um conto de Borges, o Jorge Luís, aquele Nobel portenho. Não é. É uma síndrome que ninguém consegue explicar. O colega Marcel Hartmann até tentou, há dois anos. Entrevistou argentinos ilustres radicados no RS, como o psicanalista Alfredo Jerusalinsky e o neurocientista Iván Izquierdo. Eles acreditam que o fenômeno atinge não só os argentinos, mas os turistas em férias: quem viaja pretende se desprender de suas obrigações, fica distraído, esquece compromissos....

Mas esquecer gente!? Como se explica? Aliás, os dois cientistas não conseguiram explicar por que uruguaios e paraguaios que vêm às praias gaúchas não esquecem seus familiares à beira da estrada. Nem unzinho, para servir de exceção.

O mistério continua, mas na falta de solução, proponho uma troca: que tal esquecer chatos à beira da estrada, em vez de argentinos? (a menos que o chato seja argentino). Por exemplo: aquele sujeito que a viagem toda discute política, religião e futebol, te provocando. Pior ainda se ele não é íntimo, pediu carona e não mexe no bolso nem para pagar o pedágio.

Outro a ser esquecido é aquele da excursão que insiste em música alta e bagunça no ônibus, quando todos querem descansar. Aí você aproveita uma parada num restaurante e...pé na tábua. Sem olhar para trás.

E que tal deixar na estrada aquela parente que sempre pergunta por que você não se casou ainda, quando vai virar pessoa séria ou quando vai bancar a festança familiar? E aqueles que pedem carona e insistem em levar gato, cachorro, papagaio...Há também os que ficam mexendo no rádio e ainda reclamam de que você não tem gosto bom para música.

Pensando bem, esquecer alguns tipos até que não é má ideia. Desde que não achem que o chato sou eu. Aí não vale. Chato é sempre o outro. Esquecer alguns tipos até que não é má ideia. Desde que não achem que o chato sou eu. Aí não vale. Chato é sempre o outro

*O colunista David Coimbra está em férias e retorna no dia 18/2

HUMBERTO TREZZI

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