sábado, 25 de janeiro de 2020



25 DE JANEIRO DE 2020
DIÁRIOS DO MUNDO

"O Chile está passando por um problema de maturidade"

Fernando Schmidt Ariztía, embaixador do Chile no Brasil

Passados três meses, as manifestações nas ruas de Santiago diminuíram mas não foram encerradas. O governo, acusado inicialmente de truculento, ouviu boa parte das reivindicações - fez mudanças drásticas na aposentadoria e no sistema de saúde. O país passará por plebiscito no dia 26 de abril para definir se a população quer nova Constituição. Em entrevista à coluna, o embaixador chileno no Brasil, Fernando Schmidt Ariztía, comenta o que mudou no país depois da onda que abalou a nação.

O modelo econômico adotado pelo Chile era elogiado por muitos governos. O que deu errado?

Não é necessariamente o modelo que está sendo questionado. Estão sendo questionados elementos do chamado modelo que ameaçam as vantagens, a consolidação de uma classe média. O país está passando por um problema de maturidade. A classe média, imensa maioria do país, está acostumada a passar férias no Exterior, tem um, dois, três carros às vezes, e conta com nível de consumo consolidado, começou a se sentir ameaçada por alguns elementos, como a previdência. Está em andamento uma bateria de reformas previdenciárias. O segundo elemento é a reforma no sistema de saúde, onde já foram aprovadas duas ou três mudanças para dar satisfação a alguns elementos, como lista de espera (para consultas), preços dos medicamentos e outros aspectos. Essa é uma demanda que se manifestou nas ruas de Santiago pacificamente desde o dia 18 de outubro. São manifestações pacíficas, que todos endossam como parte da nossa democracia. Isso contrasta com a violência.

O presidente Sebastián Piñera tem aceitado as reivindicações por medo de que a crise derrubasse seu governo ou porque reconhece os problemas do modelo chileno?

É um reconhecimento das dificuldades. Tudo o que está fazendo é um ajuste bastante drástico de diversos gargalos que já tínhamos. Trata-se de consolidar os ganhos. A imensa maioria das pessoas no Chile rejeita a violência e quer que todo esse estado caótico termine.

O governo reconhece que eram necessários ajustes ao modelo liberal chileno?

O modelo é o livre-mercado e isso não está em jogo. Não é o Estado que quer intervir na vida das pessoas. O Estado vai intervir mais, sim. Mas sem atingir o essencial. Não se trata de nacionalizar meios de produção. Nenhuma das propostas aponta para alterar a autonomia do Banco Central, para expropriar a poupança dos trabalhadores.

O senhor acredita que é necessária a elaboração de uma nova Constituição?

Necessária ou não, é um debate que está colocado. Constituições não resolvem problemas diários das pessoas, como a fila do hospital. Novas constituições às vezes são necessárias para renovar o pacto político. Mas os problemas não são resolvidos por elas. Quando uma constituição é renovada o que se está dizendo é que o pacto político também será renovado.

No início dos protestos, em outubro, o governo decidiu colocar o Exército nas ruas para reprimir manifestações. A medida foi questionada porque lembrou a ditadura. Foi um erro?

O governo tem o dever de garantir a ordem pública, que o cidadão possa se movimentar livremente, abrir sua loja sem preocupação. Deve garantir os direitos dos cidadãos. Como quando o Exército interveio no complexo da Maré, do Alemão (no Rio de Janeiro), mas isso não significa que o governo está utilizando as Forças Armadas para consolidar uma ditadura.

< A SEMANA QUE EU VI

EUA ARMADOS

Grupos pró-armas deram incrível demonstração de força na segunda-feira ao marcharem pelas ruas de Richmond, na Virgínia (EUA), contra a política do governador democrata que deseja limitar o acesso a arsenais. Foi indicativo da polarização da sociedade americana que se prepara para a corrida eleitoral.

TRUMP

O presidente Donald Trump foi o grande vencedor da primeira sessão do processo de impeachment no Senado. Republicanos conseguiram, na terça-feira, barrar o pedido dos democratas por novos depoimentos e pelo acréscimo de documentos ao caso.

GUAIDÓ

Juan Guaidó, líder da oposição venezuelana, que se autoproclamou presidente em 23 de janeiro de 2019, foi recebido em Davos, durante o Fórum Econômico Mundial, como chefe de Estado. Não se sabe o que ocorrerá quando tentar voltar a seu país - uma ordem o proibia de deixar o território, sob pena de ser preso.

RODRIGO LOPES

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