06 DE JANEIRO DE 2020
IGREJA CATÓLICA
Arquidiocese contra abusos sexuais
Seguindo ordem do Papa, comissão será lançada na Capital para avaliar e simplicar processos envolvendo crimes de religiosos
A tolerância zero determinada pelo papa Francisco em relação a abusos sexuais cometidos por padres, outros religiosos e agentes de pastoral está prestes a ser implantada na Arquidiocese de Porto Alegre. Um grupo formado por especialistas e autoridades trabalha desde agosto para lançar em fevereiro, na Quarta-feira de Cinzas, com a Campanha da Fraternidade de 2020, a Comissão Arquidiocesana Especial de Promoção e Tutela de Crianças, Adolescentes e Pessoas Vulneráveis.
Por trás do nome complexo, está uma estrutura que tem o desafio de avaliar e simplificar processos que por décadas macularam a imagem da Igreja diante do problema dos abusos acobertados por superiores e nunca punidos. A comissão é composta por padres, uma delegada da Polícia Federal (PF), uma procuradora de Justiça e por psicopedagogas, psicólogas, psiquiatras, uma assistente social e um jurista.
Em maio do ano passado, o Papa deu prazo até junho de 2020 para que todas as arquidioceses do mundo criassem canais para denúncias e comissões para apuração de suspeitas de abusos sexuais. A Arquidiocese de Porto Alegre é a primeira no país a formular regramento de como os casos devem tramitar e serem apurados, além de ser uma das primeiras a instalar o comitê.
- A criação da comissão é a resposta ao documento Vos Estis Lux Mundi (Vós sois a luz do mundo), carta do papa Francisco lançada em maio. O texto expressa a determinação da comunidade de fé em colaborar no combate ao abuso de poder, consciência e sexual. Desde que a Igreja se viu atingida de forma mais direta por esse tipo de crime, inaugurou-se um caminho para combatê-lo em todos as instâncias da vida eclesial, incluindo informação e formação - destaca dom Jaime Spengler, arcebispo metropolitano.
Entre as determinações do Papa, está o fim do sigilo. Qualquer cidadão poderá ter informações sobre situações suspeitas que estejam sob investigação. Casos que chegarem ao conhecimento da Igreja serão compartilhados com o Ministério Público (MP) e as polícias. E, em no máximo 30 dias, a situação tem de ser informada à Congregação para Doutrina da Fé, em Roma. Se não fizer essas comunicações, o superior responsável será deposto imediatamente.
Reparações
Internamente, a Igreja fará um procedimento administrativo de apuração que escapa da burocracia - e da demora - do processo canônico. O prazo para conclusão é de 90 dias. Durante a investigação, o padre sob suspeita será proibido de atuar, sendo afastado do convívio social. O MP tem de ser informado sobre o local em que ele está - a medida coloca fim à sistemática da Igreja de transferir padres suspeitos para atuar em outras comunidades onde, simplesmente, os abusos poderiam se repetir.
Ao final da apuração, a conclusão será julgada pela comissão, e não apenas por um bispo, que poderia não ter a imparcialidade necessária. Se for provado caso de assédio, o padre fica proibido de trabalhar com crianças e adolescentes. Se for situação de abuso sexual (em qualquer das suas modalidades) ou de uso de imagens pornográficas, o religioso será "demitido", ou seja, perderá o sacramento. A Igreja estará ainda comprometida com ato de reparação: pagará para a vítima tratamento psicológico, psiquiátrico e espiritual.
O trabalho é coordenado na Capital pelo padre Fabiano Schwanck Colares, da Paróquia Nossa Senhora da Conceição.
- Nunca mais o assunto ficará debaixo dos panos. O Papa tirou o sigilo e quer uma linha direta com os coordenadores das comissões em todo o mundo, o que impedirá que as situações não cheguem ao conhecimento dele. E os superiores que não cumprirem as determinações de rigor com a apuração serão punidos - diz padre Fabiano, mestrando em Direito Canônico.
Regras de conduta, que também estão sendo formuladas pela comissão, valerão não só para padres, bispos e religiosos, mas também para freiras, seminaristas, catequistas, orientadores de grupos de jovens e funcionários das igrejas. O protocolo de como agir traz orientações simples, mas que visam a fechar o cerco em relação à vulnerabilidade de crianças e adolescentes. Por exemplo: padres não poderão receber nas casas paroquiais crianças e adolescentes desacompanhados, estão proibidos de dar carona e de promover confissão a portas fechadas ou de fazer passeios sem acompanhamento.
Na Quarta-feira de Cinzas (26 de fevereiro), dom Jaime vai assinar um decreto canônico instalando oficialmente a comissão.
ADRIANA IRION
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