10 DE AGOSTO DE 2019
CARPINEJAR
Desaprendemos a conversar
Existe uma grande dificuldade para conversar com uma pessoa reservadamente. Para realmente entender o que o amigo está pensando. Uma das manifestações do desaprendizado do diálogo é a epidemia de grupos no WhatsApp. Criam-se grupos para qualquer iniciativa, especialmente quando não é necessária.
Você vai tomar café com colegas? Inventa-se um grupo para descrever a chegada no local do encontro. Só para não ter que avisar os dois amigos em privado de um eventual atraso. É preguiça de digitar duas vezes a mensagem.
No emprego, tem um trabalho importante pela frente, o primeiro gesto é abrir um grupo para marcar uma reunião. Mesmo que os incluídos estejam na mesma repartição, dividindo baias vizinhas.
A ânsia pelo registro é um dos males do trato corporativo que se espalhou pelos laços pessoais. Para qualquer ato, tem que provar que aconteceu. Você se previne de cobranças escrevendo. Depois é printar e mostrar. A paranoia vem matando as conversas faladas.
O grupo não vai durar nem 24 horas. É um entra e sai interminável de telefones em sua rede de contatos.
Qual a lógica de formar um trio no WhatsApp? Nenhuma. É o uso indevido de uma ferramenta apenas porque ela se mostra disponível.
Não queremos nos incomodar e incomodamos muito mais os nossos parceiros de rotina. Sabe aquela brincadeira: um elefante incomoda muita gente, dois elefantes incomodam muito mais? Somos elefantes na vida dos outros. Cada vez mais elefantes e menos elegantes. Cada vez mais ocupando espaço e perdendo cumplicidade.
A segmentação enlouqueceu as caixinhas de bate-papo. Surge o grupo da família e, no encalço, minigrupos derivados: dos irmãos, dos irmãos com os pais, dos avós com os netos, dos primos, dos primos com os tios. É balançar a árvore genealógica e caem sempre os mesmos vídeos e memes. Não se percebe originalidade na interação, é um ato de copiar e colar incessante, um encaminhamento automático de conteúdo engraçadinho. Quantas vezes recebe igual imagem por dia de grupos diferentes?
Em nosso cotidiano atarefado, fingimos que conversamos com o mundo inteiro e não conversamos com mais ninguém de verdade.
Tudo vira passeata e comício sem sair de casa. Resta a fachada das mensagens acumuladas e não lidas. Como se fôssemos importantes e famosos pela quantidade de panelinhas abertas em nosso perfil.
Fomentamos a praga de coletivos: da academia, do futebol, da escola dos filhos, da política, dos cachorreiros, dos adeptos do vinho... São canais infinitos de uma televisão de emojis no nosso celular.
WhatsApp tornou-se um museu de bonecos de cera em tamanho natural. Matamos o tempo, mas quem morre é a gente.
CARPINEJAR
Nenhum comentário:
Postar um comentário