sábado, 10 de novembro de 2018


10 DE NOVEMBRO DE 2018
PAULO GERMANO

BOLSONARO E A MAIORIDADE PENAL 

Em sua primeira entrevista como futuro ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sergio Moro se mostrou favorávelà redução da maioridade penal para crimes como estupro e homicídio. É uma bandeira antiga de Jair Bolsonaro, que deve levar essa ideia adiante já no início do seu governo. O problema maior, a meu ver, não será a proposta em si, mas o tipo de discussão que ela vai suscitar.

Porque a ladainha é sempre a mesma: os "de direita" são a favor, os "de esquerda" são contra. Vira uma guerra de dogmas, não um debate de ideias. Talvez porque o lugar-comum tenha definido que punir ou prender seriam práticas da direita, enquanto educar ou cuidar seriam mandamentos da esquerda. Ou também por pura birra: seria inaceitável reconhecer alguma legitimidade na forma como pensa o outro lado.

Eu mesmo, confesso, sinto engulhos só de pensar que uma opinião minha poderia se alinhar à de qualquer pessoa que defenda vingança no lugar de justiça. Não é o caso. Em princípio, não sou favorável à redução da maioridade penal: sou contra a própria ideia de existir uma maioridade penal para determinados casos. Concordo que existem crimes próprios da adolescência, movidos pela inconsequência ou pela imaturidade ou pela vulnerabilidade ou pela estupidez juvenil. Mas existem crimes que são crimes e ponto. Qualquer idade que se imponha para responder por eles me parece arbitrária.

Se o sujeito estupra e mata aos 17 anos e 364 dias, é um menor infrator. Se estupra e mata no primeiro dia dos seus 18 anos, é um adulto criminoso. Não tem sentido. Sou um entusiasta da recuperação dos presidiários, defendo como prioridade do Estado a ressocialização de ex-detentos, mas não vejo como recuperar qualquer pessoa sem começar pelo reconhecimento da plena responsabilidade do indivíduo pelos seus atos.

Um argumento frequente aponta que, como a maioria dos jovens infratores é pobre, uma medida dessas seria um ataque aos pobres. Compreendo, mas a maioria dos presos adultos também é pobre - por que esse atenuante não valeria para eles? Eu jamais negaria que a miséria, a desorganização familiar, a educação precária e a proximidade com o tráfico produzem criminosos. São chagas que o país precisa enfrentar. Mas não é razoável que essas chagas - e qualquer outra - sirvam para minorar toda sorte de atrocidades.

Por outro lado, me parece que há outra questão exigindo respostas mais urgentes: como colocar novas multidões no sistema prisional brasileiro? Nossos presídios revelam a faceta mais pavorosa do país - não há vagas para quase ninguém e, nas vagas que há, empilham-se presos em meio a baratas e ratazanas. Bolsonaro já disse que acha isso tudo uma maravilha.

- Não vem com essa historinha de "ah, os presídios são cheios e não recuperam ninguém". É problema de quem cometeu o crime - disse ele em junho, ainda como pré-candidato, ignorando que o problema, na verdade, é da sociedade.

Sabe-se que, quanto mais caóticas as cadeias, mais fácil para o crime organizado comandá-las. Também se sabe que a esmagadora maioria dos detentos hoje sai da prisão mais violenta do que entrou. A prioridade precisa ser esta, resolver o que já existe e não funciona. Por mim, a redução da maioridade penal pode esperar o tempo que for. Quem estupra, tortura e mata aos 16 anos precisa ser preso, mas precisa também do lugar para ser preso.

Primeiro arranjem esse lugar, desativem essas masmorras e depois, sim, vamos falar em justiça.

PAULO GERMANO

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