quarta-feira, 29 de abril de 2020


29 DE ABRIL DE 2020
NÍLSON SOUZA

Quarentena fora de casa


Se você não estivesse em casa e pudesse escolher um lugar de sua cidade para passar a quarentena, que lugar escolheria? Evidentemente, estamos excluindo dessa hipotética pesquisa as casas de parentes e amigos, assim como sítios e residências de praia. O exercício de imaginação é o seguinte: isolamento, sem companhia, num local público disponível só para você.

Essa hipótese, que lembra um pouco o enredo de filmes como Perdido em Marte ou O Náufrago, me ocorreu depois de ver uma reportagem com o jovem jogador colombiano do São José que optou por passar o período de isolamento social sozinho, no alojamento do clube. Ele tem o estádio inteiro para se exercitar, mas, na hora de fazer a própria comida, pega o telefone e pede socorro à mãe, na Colômbia.

Acho que também escolheria um local bem espaçoso da minha cidade, como, por exemplo, o Jardim Botânico. Penso que seria bem suportável, talvez até prazeroso, acordar com o canto dos pássaros e passar o dia entre a vegetação, percorrendo as trilhas e visitando os recantos arborizados do nosso belo parque metropolitano. Além disso, haveria instalações interessantes para inspecionar - o Museu de Ciências, o serpentário, o viveiro de mudas, o anfiteatro e outros espaços voltados para a preservação da flora.

Outro local atrativo, para mim, seria uma livraria. Não fosse a minha leve claustrofobia e o medo de que os mais de 60 relógios badalassem ao mesmo tempo à meia-noite, eu pediria à minha amiga Denise Filippini para tomar conta do seu paraíso de livros novos e usados, na Jerônimo Coelho, no centro de Porto Alegre. Seria uma aventura inesquecível passar a quarentena na companhia do grande Erico Verissimo, que empresta o nome à livraria, e de centenas de outros escritores talentosos que habitam aquele lugar encantado.

Dia desses, Vargas Llosa escreveu que aprender a ler foi o que de mais importante aconteceu na sua vida. Os escritores, às vezes, exageram um pouco. Mas sou obrigado a concordar que uma quarentena sem leitura seria bem menos suportável.

E você, que me leu até aqui, que lugar escolheria?

NÍLSON SOUZA

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