25 DE SETEMBRO DE 2017
DAVID COIMBRA
Depois do horário de verão, a volta do rei
O governo vai fazer uma enquete entre a população para decidir se acaba ou não com o horário de verão. Eu jurava que essa era uma questão técnica, de economia de energia elétrica, que exigia complexos cálculos de sisudos engenheiros. Agora vejo que não. Na verdade, o horário de verão só existe porque alguém achou legal.
De certa forma, é bom, porque coisas que existem só por serem legais são legais. O governo, por exemplo, não é legal e existe por outras razões mais sérias. Por que é que existe presidente mesmo? Nós decidimos isso em outra consulta popular, em 1993. Naquele plebiscito, havia a possibilidade de escolhermos rei, ao invés de presidente. Talvez tenha sido um erro não optar pelo rei. A Inglaterra se dá muito bem com esse sistema, a família real é uma distração para os plebeus. Já os nossos plebeus só se distraem insultando políticos na rua ou nos aeroportos. Muito agressivo.
Nós íamos bem quando tínhamos rei. Sinto o maior apreço por nossos Pedros. Ontem, 24 de setembro, foi aniversário da morte de Dom Pedro I, e só eu lembrei.
Uma vez, estava na Áustria e fui visitar um daqueles suntuosos palácios dos Habsburgos. Caminhava encantado pelo lugar, acompanhado por uma das guias do museu, uma austríaca muito... germânica. Ela foi me conduzindo pelos corredores, falando sobre as obras de arte mais importantes. De repente, parou na frente de um quadro da Imperatriz Leopoldina e disse:
- Essa é a princesa Maria Leopoldina. Ela foi assassinada a pontapés pelo marido, o português Dom Pedro I, quando estava grávida.
Acho até que, ao terminar a frase, ela me deu uma olhada de viés.
Tive ganas de sair em defesa de Dom Pedro, porque essa informação não é confirmada. Só não briguei para não causar um incidente internacional.
É verdade que Dom Pedro e Dona Leopoldina andavam às turras por causa da Marquesa de Santos, que a imperatriz chamava de "monstro sedutor", mas houve exagero nessa história. Dom Pedro, inclusive, estava no Rio Grande do Sul, quando Leopoldina adoeceu do mal que a mataria.
Agora, é claro que o caso de Dom Pedro com a marquesa incomodava Leopoldina. Não exatamente por causa da infidelidade. Era normal e até esperado que reis e príncipes mantivessem relações extraconjugais. Nesse terreno, Dom Pedro poderia ser considerado um campeão. No Brasil, somou 17 amantes conhecidas e 18 filhos conhecidos, fora as desconhecidas e os desconhecidos. O que torturava Leopoldina é que com a marquesa era diferente. Dom Pedro amava a marquesa e não cessava de declarar esse amor nas cartas que trocava com ela. Assinava-se "Demonão" ou "Fogo Foguinho", derramava-se em sentimentos e até lhe dedicava poemas eróticos, tipo:
Este lindo passarinho canta,
brinca, pica e fura,
mas quando torna a repicar,
é mais doce a picadura.
Era bom, o Dom Pedro!
Nas mesmas cartas, descrevia as doenças venéreas que contraía devido à intensa atividade intralençóis, além de seus recorrentes problemas intestinais. "Cheguei a casa, tomei a tisana e até agora obrei cinco vezes e muito".
Obrei. Gosto desse verbo. Pena que está em desuso. As pessoas deviam obrar mais.
Dom Pedro era também um amigo leal. Protegeu seu camarada Chalaça mesmo quando o Brasil inteiro acusava-o de corrupção, como se ele fosse um Geddel.
Se hoje tivéssemos um rei como Dom Pedro, tudo seria mais fluido. Os textos no Facebook seriam a respeito de suas aventuras sexuais, todos discutiriam os vestidos das princesas e o garbo dos principezinhos. E brincar de tomar decisões que mudam até as horas do dia só por bonito não seria considerado esdrúxulo. Os reis, afinal, têm seus caprichos, o que é bastante sabido. Sou pela volta da monarquia. Isso de presidente não está dando certo.
DAVID COIMBRA
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