segunda-feira, 23 de dezembro de 2019


23 DE DEZEMBRO DE 2019
CELSO LOUREIRO CHAVES

A surpresa das redescobertas

Enquanto se fala no aniversário de Beethoven lá fora, fica-se a perguntar se a música de concerto brasileira também tem efemérides, para não ficar só nos estrangeiros. Pois que tem! Acabam de terminar os cem anos de Claudio Santoro, o compositor amazonense de obra fantástica que vai da parceira com Vinícius de Moraes em canções que prenunciam a bossa nova até a ópera autêntica, com Alma, baseada em Oswald de Andrade e revista e estreada este ano.

Encerrado Santoro, vem Alberto Nepomuceno, morto há cem anos, deixando atrás de si uma obra que as enciclopédias não cansam de assinalar: "precursora do nacionalismo brasileiro em música". Alberto Nepomuceno sempre foi um dos meus compositores preferidos, muito por conta da Sinfonia em Sol Menor, que conheci ainda nos anos 1960 numa gravação lendária do igualmente lendário selo Festa. É uma das raríssimas sinfonias de compositor brasileiro do final do século 19 e que agora deu início à série de 30 álbuns Brasil em Concerto, que o Itamaraty e a gravadora Naxos prometem lançar em capítulos.

Com a errática política externa brasileira, não se sabe o destino do Brasil em Concerto, mas o álbum inaugural de Alberto Nepomuceno vale a pena. Fábio Mechetti e a Filarmônica de Minas Gerais registraram a "minha" sinfonia de Nepomuceno e também a Série Brasileira, de onde vem o Batuque, música branca se fazendo de negra, como era de praxe no século 19. O melhor é que os mineiros resgatam o Batuque da breguice em que ele afunda quando encontra interpretações menos interessadas na substância do que no efeito fácil.

Alberto Nepomuceno está registrado na História Concisa da Música Clássica Brasileira, do crítico Irineu Franco Perpétuo, lançada em 2018. E ele também é personagem principal em Ana em Veneza, de José Silvério Trevisan, ficção publicada há 25 anos. Ouvir a Sinfonia, ler Irineu, mergulhar em Trevisan: é o caminho para lembrar Nepomuceno e entender que, para além de Beethoven, a música de concerto tem as suas brasileirices aniversariantes. Geralmente - e é este o caso - as redescobertas são sempre uma boa surpresa.

CELSO LOUREIRO CHAVES

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