sexta-feira, 25 de outubro de 2019



25 DE OUTUBRO DE 2019
DAVID COIMBRA

A razão do vexame do Grêmio

Foi vexame, sim. Dirigentes e jogadores do Grêmio insistem em dizer que não foi vexame a goleada de 5 a 0 sofrida no Maracanã, mas foi. Foi um grosso, rotundo, pastoso vexame. O capitão do time, Maicon, apelou para o argumento emocionalmente classista:

- Nós somos pais de família e trabalhadores!

De fato, são. Mas até trabalhadores e pais de família "comuns" às vezes cometem vexames, mesmo quando se esforçam.

A diferença entre jogadores de futebol de clubes grandes e trabalhadores "comuns" é que os jogadores ganham muito mais e, por esse motivo, também são muito mais cobrados. A possibilidade de serem criticados publicamente é uma das razões dos altos salários dos jogadores de futebol.

Perder de 5 a 0 acontece. Às vezes por descuido, às vezes por acaso. Mas isso pode ser considerado (quase) natural se ocorrer em um jogo de meio de campeonato, em um amistoso, ou quando o adversário é muito maior. Agora, perder de 5 a 0 numa semifinal de Libertadores, com todo o Brasil e grande parte do mundo observando, bem, isso tem um nome: vexame.

O Flamengo amassou o Grêmio como se estivesse diante de um time de anões, como na brincadeira que seus torcedores fizeram antes da partida. Poderia ter feito seis, sete, oito a zero. Não fez porque seus jogadores tiveram compaixão com os colegas de profissão. Renato viu o mesmo, tanto que declarou:

- Hoje, até uma mulher grávida faria gol no meu time.

Verdade. Como também é verdade que ele tem responsabilidade nisso. Renato e Romildo, os dois maiores responsáveis pelas conquistas do Grêmio nos últimos anos, foram os responsáveis por esse? bem, vexame.

O maior defeito deles não tem a ver com competência, que eles são competentes. Nem com o empenho ou com a inteligência, que eles se empenham e são inteligentes. O maior defeito deles é acreditar demais na força intangível, invisível e provavelmente inexistente da mística construída no seu entorno.

Esse é um mal que atinge os vencedores. Eles se ensoberbecem com as próprias vitórias e passam a acreditar que estão destinados a vencer. Júlio César, não o goleiro, o imperador, uma vez tinha de atravessar um pedaço de mar em uma canoa frágil, durante uma tempestade. Os remadores olharam para as ondas e se assustaram. César sorriu e lhes tranquilizou:

- Nada temam. Vocês levam César e a sua fortuna.

Fortuna, no caso, com o significado de sorte.

César achava que a sorte o protegeria até da tormenta marítima.

O barco bateu contra os recifes e ele teve de nadar muito para se salvar. Anos depois, a sorte não o livrou dos punhais dos senadores.

A fortuna, a sorte, a mística, seja o que for, podem gerar confiança, mas podem também gerar arrogância e, como ensinou a Bíblia, "a soberba precede a ruína, a arrogância vem antes da queda". Você acredita demais no transcendental e deixa de ser, minimamente, científico.

Renato e Romildo têm desprezado o método científico. Que não é usado só por cientistas. Você o usa, na sua vida privada. Assim: se você tem um problema, você observa os fatos e as circunstâncias que o cercam e deduz uma hipótese para solucioná-lo. Em seguida, experimenta essa possível solução. Se não deu certo, a descarta, e tenta outras, até acertar. Se deu certo, emprega-a novamente, caso o problema reapareça. É reto e eficiente.

Renato e Romildo não parecem pensar assim. Renato tentou dezenas de vezes André como solução. Não deu certo. Mas ele voltou a tentar e numa semifinal de Libertadores e contra um time superior. Mais uma vez, deu errado, só que agora de forma humilhante. Quanto a Romildo, ele já perdeu campeonatos por manter no grupo jogadores que tinham provado sua deficiência. Neste ano, tem outros jogadores na mesma condição. E os manteve. E, como era previsível, eles falharam.

Não é preciso ser teórico, estudioso ou cientista para se valer do método científico. É preciso apenas ter bom senso. E entender algo simples e duro como a vida: que a repetição de um erro jamais constrói um acerto.

DAVID COIMBRA

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