terça-feira, 1 de maio de 2012



01 de maio de 2012 | N° 17056
DAVID COIMBRA

Meus dias de carimbador

Uma época trabalhei na microfilmagem do Estado. Tinha lá meus 17 anos e havia sido contratado como estagiário. Minha função era carimbar documentos, separá-los por natureza e amarrá-los com um atilho. Só isso. Então, passava o dia inteiro com aquele carimbo, pam, pam, pam! Depois, juntava tudo em uma pilha, atava e colocava numa caixinha de madeira, de onde outro estagiário os recolhia para levá-los ao arquivo.

O dia todo, todos os dias, pam, pam, pam! Se estivesse com sono, como em geral estava depois do almoço, minha carimbada era flácida como um argentino do Grêmio: pam... pam... Se estivesse irritado por ter saído de casa atrasado, sem café da manhã, as carimbadas eram pancadas de protesto: PAM! PAM! PAM! Se estivesse animado porque a loira do sétimo andar havia me dado uma olhada de lado no elevador, as carimbadas eram festivas: PARAMPAMPAM! PAM-DAM-BAM!

E pronto. Era essa a minha diversão. De resto, passava os dias pensando no fim de semana. Afinal, que motivação no trabalho pode ter um cara que só tem de carimbar e carimbar e nada mais?

É para esses caras, para os que têm de carregar um fardo diário, para os que se acordam ao alvorecer e voltam para casa quando a lua está alta no céu, para os que ganham pouco e trabalham muito, é para esses que existe um feriado como o de hoje, o Dia do Trabalhador. Jogador de futebol, não. Jogador de futebol faz todos os dias o que os trabalhadores fazem no fim de semana: diverte-se jogando bola. E ainda ganha para isso.

Hoje, portanto, é o dia dos assalariados, dos escriturários, dos cobradores de ônibus, dos motoristas de táxi, dos comerciários, dos operários, das secretárias, dos professores, mas não dos jogadores. Treinos físicos e concentrações semanais até podem transformar o jogo de bola profissional em uma atividade exigente, certo, mas trabalho não é.

O que entrará para a História

A História é retroativa. Pegue, por exemplo, um homem notoriamente bem-sucedido: o ex-presidente Lula. Você pode odiá-lo e a toda a sua descendência, dos retirantes dos intestinos de Garanhuns à elite do centro de São Bernardo, mas não haverá de negar que o governo dele desfruta de boa imagem e que ele já está inscrito nos chamados anais da História como um dos maiores governantes do Brasil.

Lula enfrentou denúncias sérias de corrupção contra seu governo e até contra seus familiares. Algumas dessas denúncias foram comprovadas e inclusive reconhecidas. Talvez tenham sido mais graves do que as que derrubaram Collor. Mas Lula se manteve altaneiro no cargo e sua gestão vicejou, enquanto a Era Collor se transformou em paradigma de corrupção.

Por que a diferença?

Porque, com Lula, a economia foi bem. Se Collor tivesse conseguido debelar a inflação com o plano econômico da famigerada Zélia, talvez não tivesse caído e, hoje, tudo que aconteceu no seu governo não pareceria trevas e danação, como parece.

A avaliação da História não depende só dos fatos. Depende também do que se sente a respeito dos fatos.

Depois do Gre-Nal de domingo, o técnico perdedor, Luxemburgo, foi severamente criticado por sua reação à atuação dos robustos gandulas que o Inter colocou em torno do campo. Bobagem. Isso teve tanta importância na partida quanto o Inter ter espalhado sal grosso na casamata do Grêmio para “sugar as energias” do adversário. Luxemburgo deveria ser criticado por outra razão: por ter escalado mal o time.

O Grêmio entrou no jogo com um meio-campo frágil e acabou contido pelo Inter. Foi um erro primário do treinador. Esse, sim, o erro decisivo. Mas não é o que está entrando para a História. O que já está na História é que esse foi o clássico dos gandulas. Às vezes não dá mesmo para se confiar na História.

Marxista

Quantidade gera qualidade, como disse Marx.

O Grêmio precisa de muitos reforços e até deve se livrar de alguns jogadores que pesam demais na folha salarial, mas a varrição sem critérios é um equívoco. Não adianta só ter um time, é preciso ter um grupo forte.

O Grêmio não tem nem time, quanto mais grupo. Então, manter alguns jogadores que não são exatamente titulares, mas que são reservas eficientes, é fundamental. Um Rochemback, por exemplo, fez falta nesse Gauchão.

O Inter tem perseguido essa filosofia. Tinha D’Alessandro e Oscar, trouxe Dátolo; tinha Kleber, trouxe Fabrício; tinha Damião, trouxe Jô e Gilberto. Às vezes dá errado, como deu com Cavenaghi, mas aí é o caso de se contratar ainda mais e não menos.

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