quinta-feira, 17 de julho de 2025


17 de Julho de 2025
CARPINEJAR

Nossas indefectíveis sobremesas

O Rio Grande do Sul é conhecido pelo churrasco, pela abundância das carnes. Mas somos tão bons no salgado quanto no doce. Ao mesmo tempo que existe a tradição da picanha e da costela, a fama do xis e do bauru, há clássicos incontestáveis em nossas sobremesas.

Jamais fale mal da torta de sorvete. É comprar briga com a nossa memória afetiva. É uma receita que persiste há quatro décadas, misturando sorvete de baunilha, merengue e calda de chocolate numa fatia só.

Trata-se de um fondue no prato. O que ninguém entende: tomamos chimarrão no calor escaldante, e gostamos de comer torta de sorvete no inverno mais rigoroso. Somos pessoas dos extremos.

O que desejamos é que, na hora de servir, a calda não seja economizada. Que vire uma sopa. Para, no fim, beber o suco achocolatado transbordando do pratinho. Há variações caseiras com profiteroles (aqueles pequenos pãezinhos recheados com sorvete ou creme) ou bolachas Maria.

Um de nossos atrativos é também o quindim de Pelotas (não perca a oportunidade de degustar o original na 31ª Fenadoce, que vai até 3 de agosto): perfeito, simétrico, lindo. Um sol portátil que cabe na palma da mão. O girassol tem inveja de seu amarelo profundo.

É uma obra de arte para mordidas pequenas, pelas beiradas, sentindo pouco a pouco o coco ralado, o açúcar e as gemas de ovos. Se não se lambuzar, você não foi feliz. Somos bons no pudim, mas imbatíveis na ambrosia e no sagu, atrações nas reuniões familiares do final de semana.

O sagu veio da Serra para ficar. Suas bolinhas lançam feitiços nas crianças. Lembram as bolhas de champanhe, de sabão. Apresentam o leve gosto de vinho tinto, numa iniciação às nossas vindimas. É tão régio que ostenta sempre a coroa do creme de baunilha por cima. A ambrosia é chamada de manjar dos deuses. De acordo com a mitologia grega, concede imortalidade àqueles que a provam. Nesse sentido, já sou eterno.

Trazida ao Brasil pelos portugueses, a ambrosia tornou-se um de nossos doces de colher prediletos, aclimatada com nosso sotaque. O modelo gaúcho se diferencia principalmente pela textura firme e granulada, formada por pedaços bem definidos de ovos coalhados no leite, cozidos lentamente e sem mexer, para preservar os blocos dourados, quase uma compota realçada por cravo e canela, feita em tachos de cobre nas cozinhas do Interior.

Ainda temos o arroz-doce ou arroz de leite, aqui preparado com leite de vaca, não com leite de coco como no Nordeste. É uma papinha cremosa que dá folga aos dentes, com toques cítricos aumentando o contraste de cascas de limão, laranja e canela.

Não sou louco de deixar de fora os brigadeiros das festas de aniversário. Em nenhum "parabéns pra você" no Brasil encontrará versões tão minúsculas que se derretem na língua. Somos adeptos das pequenas joias de leite condensado, colocando-as inteiras na boca.

As almas mais antigas cultivam o hábito do doce de casca de laranja azeda, na alquimia das sobras, ou de abóbora, crocante na superfície, macio por dentro. Nem o café da manhã escapa da exuberância da glicose. A chimia, ou Schmier (que significa "algo pastoso" em alemão), é uma geleia que transforma qualquer sanduíche insosso numa guloseima inesquecível. A sensação é que você está mastigando a própria fruta. Pode ser de maçã, figo, morango, ameixa, uva, goiaba.

E, para arrematar, seguindo a herança germânica em nossa mesa, nada ganha da nossa cuca. Cuca de verdade se come no Estado. Merecia ser patenteada. É um panetone para todo o ano, um bolo doce coberto de farofa (farinha de trigo, açúcar e manteiga). Seus sabores são um caso de amor à parte: com frutas (uva, banana, abacaxi, morango), ou queijo, ou chocolate.

É tão importante que já recebeu o título de Patrimônio Cultural Imaterial do Rio Grande do Sul, assim como os doces de Pelotas. É tão fundamental que tem gente que não resiste e continua devorando no almoço.

É de cair os butiás do bolso. 

CARPINEJ

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