
11 de Julho de 2025
GPS DA ECONOMIA - Marta Sfredo
Vitória de "patriotas" ameaça empresas e empregos
Não houvesse um documento escrito, seria inacreditável. O deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e um autoproclamado "jornalista no exílio", Paulo Figueiredo, emitiram nota em que apontam como vitória a imposição de uma tarifa de 50% sobre todas as exportações do Brasil aos Estados Unidos.
Caso essa alíquota seja mantida, incapacita parte das vendas nacionais ao país de Donald Trump. Isso ameaça empregos e empresas no Brasil. Só os cinco produtos mais vendidos aos EUA somam uma receita de US$ 7,4 bilhões. No ano passado, as exportações brasileiras aos americanos foram de US$ 40,3 bilhões.
A nota pública assinada pelos dois é uma confissão de torcida contra o Brasil. "Uma hora a conta chega", diz o texto. "A carta do presidente Donald J. Trump ao presidente brasileiro é clara, direta e inequívoca. E reflete aquilo que nós, há muito tempo, temos denunciado: o Brasil está se afastando, de forma deliberada, dos valores e compromissos que compartilha com o mundo livre".
Os erros de Lula
O "presidente brasileiro" cometeu inúmeros erros, especialmente relacionados ao equilíbrio fiscal, mas de várias outras naturezas. O que é do jogo democrático é apontar esses equívocos, criticá-los e tentar corrigi-los pela atuação dos demais poderes, Legislativo e Judiciário, sem atropelos autoritários.
Na nota, o parlamentar licenciado reivindica impressões digitais na medida de Trump que pode custar caro não ao governo Lula, mas a milhares de trabalhadores e a centenas de empresas que têm no mercado americano clientes responsáveis por boa parte de seus negócios. Eduardo diz que tem falado com representantes do governo Trump para denunciar o que chama de "escalada autoritária" no Brasil. E deixa claríssimo qual é seu foco ao chamar os 50% de ?tarifa-Moraes?".
Ao citar o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, que relata o caso contra seu pai, o "patriota" deixa claro que seu objetivo não é o nacional, mas o particular e familiar. Que como sempre foi claro para muitos brasileiros, está muito acima dos interesses do Brasil. _
Depois de abrir no patamar de R$ 5,60, o dólar fechou com elevação menor, de 0,7%, para R$ 5,542. A fabricante
de aviões Embraer teve queda de 2,93% nas ações. Aeronaves são a quarta maior exportação aos Estados Unidos.
Por que é falso o argumento de Trump para taxar o Brasil
Os números desmentem Donald Trump. Apesar de o presidente americano justificar o tarifaço de 50% mencionando "muitos anos de políticas tarifárias e não tarifárias do Brasil, causando déficits comerciais insustentáveis contra os EUA", os dados mostram o contrário.
O Brasil não só compra mais do que vende aos EUA, como também o déficit nacional, considerando só os primeiros seis meses deste ano, é quase seis vezes maior do que no mesmo período do ano passado.
Segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), as exportações brasileiras aos EUA somaram US$ 20 bilhões até junho, e os envios de lá para cá, US$ 21,7 bilhões. O Brasil teve déficit de US$ 1,7 bilhão. Nos primeiros seis meses de 2024, o saldo negativo nacional era de US$ 279,7 milhões.
Há décadas, quem tem déficit com os EUA somos nós. Ou seja, Trump não tem justificativa econômica para aplicar taxas contra o Brasil - ainda mais de 50%, a mais alta entre os 22 países já notificados.
Em 2 de abril, quando as tarifas "recíprocas" foram anunciadas com base no saldo negativo dos americanos com outras nações, o imposto de importação que seria cobrado de produtos brasileiros era de 10%, o menor nível. Nada mudou nas relações econômicas desde então.
O comércio entre os dois países, porém, é muito mais importante para o Brasil: os EUA são o segundo maior parceiro comercial, tanto em importações (15% do total) quanto em exportações (12% do total). _
Como o Brasil pode retaliar os EUA
Ao afirmar que "qualquer medida de elevação de tarifas de forma unilateral será respondida à luz da Lei brasileira de Reciprocidade Econômica", o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não está avisando que também vai adotar alíquota de 50%. Inclusive, se ouvir recomendações de 11 entre 10 especialistas em comércio exterior, vai evitar esse tipo de represália.
- O Brasil não vai retaliar da mesma forma porque o que mais importamos dos EUA são insumos, máquinas, equipamentos, peças. Prejudicaria a própria indústria brasileira se elevasse as tarifas na mesma proporção - pondera Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior e consultor na área.
Ele cita a possibilidade de retaliar cassando ou suspendendo patentes de medicamentos americanos no Brasil:
- O lobby mais poderoso em Washington é o das farmacêuticas. Uma ameaça desse tipo mobilizaria todo o Congresso americano para evitar, além de eventuais perdas no Brasil, um precedente de um país importante que poderia se estender a outros países do mundo. _
Aço poderá ter alíquota de 100%?
Setor que enfrenta tarifa setorial de 50% desde 4 de junho, o siderúrgico também teria de pagar 50% a mais com o tarifaço de Trump? Especialistas avaliam que não, mas ressalvam que não está claro.
Marco Polo de Mello Lopes, presidente-executivo do Instituto Aço Brasil, diz que, consultando analistas, o "entendimento" da entidade é de que não. Welber Barral, consultor de comércio internacional, detalha que a alíquota setorial é uma medida de defesa nacional, do tipo 232. Nas "recíprocas", diz, normalmente se exclui o que é aplicado sob essa norma. Mas frisa o "normalmente", porque depende do ato executivo que ainda tem de ser publicado. _
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