segunda-feira, 23 de junho de 2025


Materialistas

Fazia tempo que eu não ia a um cinema lotado. Fazia tempo que eu não ia a um cinema lotado para assistir a uma comédia romântica. Fazia tempo que eu não ia a um cinema lotado para assistir a uma comédia romântica em que a mocinha acende um cigarro atrás do outro.

O sucesso de Amores Materialistas (a estreia no Brasil está prevista para 31 de julho) não chega a ser surpreendente. Com Dakota Johnson, Chris Evans (o Capitão América da Marvel) e Pedro Pascal (da série The Last of Us) no elenco, o filme já era assunto nas redes antes mesmo da estreia nos EUA. Também deve ter ajudado o fato de o primeiro longa de Celine Song, o sensível Vidas Passadas (2023), ter recebido duas indicações ao Oscar. 

A volta do cigarro é um pouco mais difícil de entender, mas aparentemente a cultura pop está cancelando o cancelamento do tabaco, escalando um dos vilões mais odiados dos anos 1990 para coestrelar filmes, séries e clipes de cantores famosos. No clima retrô (de retrocesso e retrógrado) em que andamos, até o câncer de pulmão parece estar sujeito a "novas narrativas".

Lucy (Dakota Johnson), a chaminé em questão, trabalha em uma agência de namoros e sonha em encontrar um marido rico. Em outros tempos, seria considerada uma interesseira, quase uma Maria de Fátima, mas nos dias de hoje é apenas uma mulher pragmática, convencida de que o amor romântico nasce de um acordo que envolve vantagens e desvantagens, para ambos os lados, plenamente mensuráveis. 

Ajudando homens e mulheres a encontrar o match perfeito, Lucy funciona como uma espécie de algoritmo de carne e osso, buscando pares que correspondam ao valor de mercado dos seus clientes - em termos de beleza, conta bancária, idade e origem social. Tudo muito lógico e eficiente, mas às vezes cruel e bem pouco romântico no sentido convencional. Quando um potencial cliente, Harry (Pedro Pascal), começa a cortejá-la, Lucy dá a real: rico, alto e bonito, ele pode arranjar alguém bem melhor do que ela (que é bonita e inteligente, mas não tem grana e já passou dos 30).

Comédias românticas nunca foram condenadas pelo Ministério da Saúde, mas andavam quase tão sumidas quanto o cigarro. Quando o pessoal que ainda está na pista não parece muito convicto de que existe um futuro, que dirá um futuro com outra pessoa, fica difícil falar de amor sem soar anacrônico, superficial ou francamente delirante. 

Contando uma história que soa atual sem deixar de lado a dose de fantasia que o gênero exige, Celine Song tenta provar que é possível acrescentar algum romantismo aos fragmentos de um discurso amoroso cada vez mais desencantado. 

O conteúdo desta coluna reflete a opinião do autor

CLÁUDIA LAITANO 

Nenhum comentário: