11 DE DEZEMBRO DE 2017
L.F. VERISSIMO
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Para quem já está jogando na prorrogação, como eu, o Natal e o Ano-Novo sempre chegam como surpresas. O que, outra vez? E nos vemos compelidos a organizar um pensamento solene sobre a passagem do tempo e o fim que se aproxima. Agora que meu sangue se encaminha para o lugar da sua quietude, como li certa vez num poema asteca, e que todas as garrafas que lancei ao mar com mensagens ao desconhecido voltaram sem resposta, ou com o texto corrigido.
Agora que descobri que nenhum dos meus gurus tinha a resposta certa e um até confessou que era surdo e nem ouvira as minhas perguntas e só fazia sim com a cabeça por boa educação, o que explica ele ter respondido sim quando eu perguntei se deveria seguir o Bhagavad Gita, o Kama Sutra, O Capital ou uma combinação dos três.
Agora que não consigo mais distinguir a voz de uma secretária de outra no telefone, pois todas são eletrônicas e iguais, e da última vez que implorei por um contato humano, alguma coisa viva - uma hesitação, um erro de concordância, um resfriado, até, em último caso, uma reação irritada -, a voz disse "para reação irritada, digite 4", agora que eu não quero mais respostas, agora que eu desisti, vêm me dizer que eu não estou sozinho.
Que há outros como eu cujo sangue outrora borbulhante atingiu um remanso e já não esperam mais nada salvo a resignação dos mortos num bom sofá com controle remoto e talvez pipocas, que abominam a despersonalização, principalmente das pessoas, a pulverização de todas as certezas, o espargimento de todas as dúvidas, a eterização de todas as coisas - e que eles têm um site no qual podemos trocar desânimos?
Mas me deram o endereço errado, pois, na minha caça desesperada a ávidos de resignação e burrice programada como eu, dei num site que ensina a fazer bombas caseiras, outro de onanistas compulsivos, cheio de erros porque presumivelmente todos os seus textos são digitados com uma mão só, outro de um homem que propõe a troca de fotografias do seu bigode ridículo com as de bigodes ridículos de todo o mundo com a possibilidade de casamento.
Eu tinha entrado num fascinante mundo doente, ao entrar na internet atrás da minha turma. Na internet tudo se volatiza e vira impulso pelo ar, o que sobra é isso, o ser humano reduzido às suas fomes e às suas esquisitices primevas, livre de qualquer controle ou compunção. A cara mais terrível da liberdade: cara nenhuma, ou apenas a cara que se quiser escanear e mostrar na net, sem garantia de que seja mesmo a nossa.
L.F. VERISSIMO
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