20 DE NOVEMBRO DE 2017
FEIRA DO LIVRO 2017
A Feira do Livro sob tensão
A 63º Feira do Livro de Porto Alegre teve debates interrompidos por questões de segurança, contratempos com a Prefeitura e queda nas vendas. Nem por isso, Marco Cena Lopes, presidente da Câmara Rio-Grandense do Livro (CRL), entidade que organiza o evento, perde o otimismo em relação à celebração literária a céu aberto:
- A Feira atraiu mais uma vez público para a Praça da Alfândega, reafirmando seu papel de aproximar a população dos livros e da leitura. O objetivo foi atingido.
Em entrevista a ZH, o presidente fez um balanço dos 19 dias de Feira do Livro.
CONSERVAÇÃO DA PRAÇA
Duas queixas em relação à administração pública de Porto Alegre marcaram a Feira do Livro de 2017. A primeira foi em relação às condições da Praça da Alfândega. Segundo a CRL, a capina não estava em dia e o pavimento de pedras portuguesas estava solto em diferentes trechos das alamedas. Além disso, o recolhimento de lixo não estava sendo realizado como em anos anteriores. Para solucionar o problema, a CRL contratou uma empresa terceirizada para limpar a área interna da praça.
- O que me aborreceu foi o estado da praça. Isso não pode mais acontecer. É um desrespeito com o povo de Porto Alegre e com a Câmara Rio-Grandense do Livro, que faz um esforço tremendo para colocar a Feira na Praça da Alfândega.
Mais uma tensão com a prefeitura envolveu o Adote um Escritor. Há 15 anos, o programa, parceria da Secretaria Municipal de Educação (Smed) e a CRL, seleciona obras recém-lançadas para aquisição e trabalho em salas de aula. As atividades previam visitas dos autores às escolas e à Feira do Livro. Para Marco Cena Lopes, com a redução no valor dos repasses da Smed para a compra de livros pelas escolas, o Adote um Escritor ficou prejudicado:
- O corte prejudicou o projeto em sua raiz. Além disso, o dinheiro repassado para as escolas neste ano foi muito menor. Muitos grupos de alunos que iriam à Praça tiveram que suspender a visita por falta de verba.
POLÊMICAS
A 63ª Feira do Livro ficou marcada por momentos de tensão. O primeiro deles foi na abertura do evento, quando o CPERS-Sindicato fez um protesto ao lado do Teatro Carlos Urbim. Com palavras de ordem contra o governo do Estado e sinos, mal dava para ouvir as apresentadoras do evento.
- Achei a postura dos manifestantes desrespeitosa e oportunista. Naquele momento, quase pensei em encerrar a solenidade, mas o grupo se dispersou instantes depois. Minha bandeira também é pela educação e pela leitura, mas justamente quando a gente consegue realizar algo em nome disso, um grupo ameaça estragar tudo - avaliou Marco Cena.
Mesas que debatiam identidade de gênero ou a cultura LGBT também geraram estremecimentos. Logo nos primeiros dias de Feira, o Sarau Feminista, da ONG Cirandar em parceria com o Ponto de Cultura Feminista, foi encerrado por conta da postura de um participante, considerada ameaçadora pelas organizadores. O fato serviu de alerta para a organização, que reforçou a segurança em debates sobre o tema. A mesa Os Livros Fora do Armário: A Literatura Orgulhosamente LGBT, com os escritores Samir Machado de Machado e Natália Borges Polesso e a livreira Nanni Rios precisou ser transferida por motivo de segurança. Do Santander Cultural para o Centro Cultural CEEE Erico Verissimo e, depois, para o Teatro Carlos Urbim.
QUEDA NAS VENDAS
Cerca de 1,4 milhão de pessoas circularam pela Feira do Livro, segundo estimativa da Brigada Militar. Em relação às vendas, o balanço aponta queda de 14% em comparação com 2016. É o segundo ano seguido em que uma queda como essa é registrada - na edição 2016, as vendas foram 19% menor do que em 2015.
- O que se vê nos últimos 10 anos é uma queda vertiginosa no número de leitores. Há bons formadores de leitura. Muitas crianças são impactadas, mas perdem o hábito de ler na adolescência. Nesse cenário, somado à crise econômica, dá quase para comemorar essa queda não ser maior.
Alguns livreiros reclamaram das chuvas, que desmobilizaram o público, mas muitos sentiram falta da presença de professores e estudantes nas bancas. Em 2015, o projeto Quintanares, com verba de leis de incentivo, havia repassado cartões para cerca de 4 mil crianças e adolescentes ligados a projetos de leitura, com o valor de R$ 30 cada, a serem gastos exclusivamente em livros no evento. No ano seguinte, o projeto teve o orçamento diminuído. Já em 2017, não pôde ser realizado por falta de verba.
- Se em anos anteriores a gente conseguiu verba para os alunos participarem da Feira também comprando livros, neste ano muitas vezes tivemos até dificuldade de levar turmas até a Praça. Tínhamos um número muito maior de patrocinadores que disponibilizavam ônibus para esse transporte. As escolas de periferia são dependentes disso. Da mesma forma, o projeto Adote um Escritor colaborava com a vinda de alunos - destaca Marco Cena.
A presença de público infantojuvenil foi 22% menor do que na Feira do ano passado também em razão das greves nas escolas da rede pública - a visita à Praça da Alfândega costuma ser um programa mobilizado por professores junto aos alunos.
FAVORITOS DO PÚBLICO
A programação da Feira rendeu momentos de boa circulação de público na Praça da Alfândega. Entre os autores que mais atraíram leitores, estão a escritora paulista Monja Coen, que teve a sessão de autógrafos mais concorrida, em 11 de novembro, a mineira Conceição Evaristo e o moçambicano Mia Couto - os admiradores deste já faziam fila para retirar senhas 10 horas antes da palestra realizada no dia 13.
Outro encontro com senhas muito disputadas foi o que reuniu entre quatro renomados cronistas: Luis Fernando Verissimo, Antonio Prata, Gregorio Duvivier e Ricardo Araújo Pereira conversaram com o público no evento mediado pelo jornalista Roger Lerina. Verissimo também voltou a ser destaque na quinta-feira passada, com um bate-papo no Auditório Barbosa Lessa do Centro Cultural CEEE Erico Verissimo. No encerramento da Feira, ontem, foi a vez do Nobel de Literatura nigeriano Wole Soyinka lotar o Theatro São Pedro com sua palestra.
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