quinta-feira, 9 de novembro de 2017


08 DE NOVEMBRO DE 2017
PEDRO GONZAGA

TEMPO DE FEIRA


Sem rodeios: a Feira do Livro me angustia. Nem os balaios com suas surpresas, nem a praça cheia, nem um chope sapecado no Bistrô do Margs aplacam-me a sensação de estar perdendo alguma coisa. Já quis culpar a Jussara e a Sandra da Câmara do Livro por oferecerem tantas atrações magníficas e simultâneas entre as quais é impossível escolher. Difícil perdoá-las. Outras vezes, resoluto, condeno os amigos escritores pelo desconforto, por lançarem suas obras em horários a que nunca posso comparecer, assim, malditos sejam todos vocês, Guido Kopittke, Ana Mottin, Claudia Tajes, Paulo Ribeiro e Mário Corso (e aproveito o ensejo para praguejar contra os outros tantos autógrafos que virei a perder). 

Depois há as atrações internacionais, os países homenageados (este ano são os invejáveis nórdicos), as mesas realizadas sempre e durante meus períodos em sala de aula. Por isso, quando alguém louva os jacarandás primaveris ou a brisa do fim da tarde que corre do rio, mal contenho minhas ganas de perguntar: e quando isso ocorrerá? Nos dias em que estiver longe do Centro?

Depois há o problema das barracas das editoras. Não há escritor ou escritora nesta cidade que, tempo ido, não tenha quase posto à bancarrota dois ou três negócios. De modo que é com um misto de constrangimento e gratidão que passo pela barraca da Arquipélago e vejo meu livro exposto, penso, que coragem, Tito Montenegro, que tenacidade, pela publicação dessas crônicas. Nessas horas, bem creio que faltam aquelas medalhas por bravura, também extensivas aos antigos livreiros que a tudo resistem, o Rui da Palmarinca, o Peter do Beco dos Livros, o Vitor da Terceiro Mundo.

Há uma hora, no entanto, em que todos os desassossegos se cessam: não há mais debates, dedicatórias, homenagens, dívidas ou compromissos. É quando cai a noite e as luzes se acendem, e as barracas ficam fáceis de percorrer, e é novembro e ainda não faz calor, e alguém nos sorri ao falarmos de literatura. Vejam bem, de literatura num mundo quase avesso às palavras.

A Feira do Livro me angustia, é certo. Em especial por durar tão pouco.

PEDRO GONZAGA

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