terça-feira, 6 de maio de 2025



06 de Maio de 2025
INFORME ESPECIAL - Rodrigo Lopes

Direto do Vaticano

Intrigas antes do conclave começar

Não se tem notícia em tempos recentes de períodos pré-conclave tão cheio de intrigas quanto este de 2025. Os cardeais já estão na 10º congregação geral (ainda haverá mais uma, hoje, a última antes de se fecharem na Capela Sistina), mas a sucessão ao papa Francisco acumula episódios de mal-estar e constrangimentos. Publicamente, os cardeais evitam comentar os incidentes, afirmam que todos esses dias estão servindo para que se conheçam melhor. Mas a verdade é que muitos dos integrantes do colégio cardinalício estão desviando da imprensa e de curiosos para evitar assuntos indiscretos.

Primeiro foi o caso do cardeal Giovanni Angelo Becciu, que, mesmo condenado por um tribunal do Vaticano por desvios de fundo de gestão da Secretaria de Estado, dizia que estaria presente na votação. Quase se formou uma rivalidade entre Pietro Parolin e seu compatriota italiano. Foram dois dias de suspense, até que Bacciu renunciou ao voto, afirmando ter decidido "obedecer à vontade de Francisco" e para contribuir pela comunhão e serenidade do conclave.

Passado o susto, outro problema apareceu: o cardeal peruano Juan Luis Cipriani, afastado por abuso sexual por Francisco, apareceu vestido de cardeal na Basílica de São Pedro para se despedir do papa argentino. Arcebispo emérito de Lima, Cipriani já foi o religioso mais influente do Peru, mas foi denunciado por ter molestado sexualmente um jovem, quando ele tinha 16 anos. Francisco o proibiu de usar os trajes de cardeal. Mas Cipriani chegou, inclusive, a participar de algumas das congregações gerais, como "quem não quer nada" - ele tem 81 anos, logo não vota no conclave.

Não bastassem as presenças incômodas, agora o Vaticano é infestado por fake news e tentativas de influenciar a eleição: circulou que o cardeal Parolin, o favorito nas apostas, estaria doente. A Santa Sé precisou vir a público desmentir a afirmação. Nos últimos dias, um dossiê foi enviado aos cardeais com uma seleção de nomes - uma lista com 20 possíveis papáveis. Sem falar na infame foto de Donald Trump vestido como papa, divulgada pela própria Casa Branca. Diante de tudo isso, a imagem do presidente americano, encarada como anedota pelos cardeais mais sisudos e chamada literalmente de "bobagem" pelos mais vocais, é o episódio mais inocente. _

Juramento de silêncio precede a escolha do papa

Funcionários do Vaticano prestaram juramento de silêncio para o conclave. Ontem, colaboradores eclesiásticos e leigos juraram sobre a Bíblia e assinaram documento comprometendo-se a manter total sigilo sobre tudo o que ocorrer durante as votações. Os cardeais farão o seu juramento na quarta-feira, antes da votação. A Santa Sé reforça a tradição de confidencialidade da eleição papal.

"Prometemos e juramos observar com a máxima fidelidade e com todos, clérigos e leigos, o segredo sobre tudo o que de qualquer forma diz respeito à eleição do Romano Pontífice e sobre o que acontece no local da eleição, direta ou indiretamente no que diz respeito ao escrutínio; não violar de modo algum este segredo, nem durante nem depois da eleição do novo Pontífice, a menos que tenha sido concedida autorização explícita pelo próprio Pontífice; nunca dar apoio ou favor a qualquer interferência, oposição ou qualquer outra forma de intervenção pela qual autoridades seculares de qualquer ordem e grau, ou qualquer grupo de pessoas ou indivíduos, possam desejar interferir na eleição do Romano Pontífice", diz um trecho do juramento.

Na quarta-feira, cada um dos cardeais eleitores colocará a mão sobre a Bíblia e declarará: "Prometo, obrigo e juro. Que Deus e estes santos evangelhos que toco com minha mão me ajudem." Após o último juramento, o mestre de celebrações pronunciará as palavras em latim: "Extra omnes" ("Todos para fora"), marcando o início do conclave. _

Quanto tempo pode levar

Não há uma regra definida para a duração de um conclave. Algumas eleições papais foram resolvidas em um único dia, enquanto outras levaram anos - como no caso do conclave de Viterbo (1268-1271), que durou quase três anos. Nos últimos conclaves, a média de duração caiu para dois dias. Porém, vaticanistas e até cardeais sugerem que a eleição do sucessor de Francisco pode levar de quatro a cinco dias, devido à diversidade de perfis no atual colégio cardinalício. _

A duração das últimas 10 eleições

Papa Pio X (1903) 5 dias

Papa Bento XV (1914) 4 dias

Papa Pio XI (1922) 5 dias

Papa Pio XII (1939) 2 dias

Papa João XXIII (1958) 4 dias

Papa Paulo VI (1963) 3 dias

Papa João Paulo I (1978) 2 dias

Papa João Paulo II (1978) 3 dias

Papa Bento XVI (2005) 2 dias

Papa Francisco (2013) 2 dias

Os horários em que sairá a fumaça da Capela Sistina

O conclave começa amanhã com uma missa chamada pro eligendo Romano Pontefice, ou "para a eleição do pontífice". Será às 10h (5h em Brasília). Depois, haverá um almoço na Casa Santa Marta. Às 16h30min (11h30min em Brasília), os cardeais se deslocarão da Capela Paulina, no interior do Palácio Apostólico, até a Capela Sistina. Os cardeais não votantes (com mais de 80 anos), então, serão convidados a se retirar. É quando as portas da capela serão fechadas para o mundo - inclusive o sinal da TV do Vaticano é cortado neste momento, e os telões espalhados pela Praça de São Pedro são desligados.

Amanhã, só haverá uma votação, cujo resultado provavelmente sairá por volta de 19h (14h em Brasília). Há pouquíssima chance de se ter um eleito nesse primeiro escrutínio - a votação que inaugura o conclave é uma espécie de balizador para as demais, ali se mede, pela primeira vez, concretamente, os favoritos - até lá, é tudo especulação.

Olhos para a chaminé

A partir daí, nos dias seguintes teremos quatro votações - duas por turno. Se no primeiro escrutínio do dia, um nome conquistar os dois terços dos votos, sairá a fumaça branca na chaminé. Caso contrário, haverá uma segunda votação ainda pela manhã. Em caso de definição do próximo pontífice, a fumaça branca poderá sair às 10h15min (5h15min em Brasília), 12h (7h), 17h15min (12h15min) ou às 19h (14h) - esses horários representam os términos das votações. Já a fumaça preta sairá regularmente, se não houver consenso, às 12h (7h em Brasília) ou 19h (14h).

Se até o final do sábado, quarto dia de votações, não houver um eleito, os cardeais poderão interromper os escrutínios para oração no domingo. De 12 a 21 de maio ainda ocorrem votações, caso não se tenha o eleito. E a partir de 22, se persistir o impasse, só ficarão os dois primeiros mais votados, em uma espécie de funil (parecido com o segundo turno de uma eleição convencional).

Nos últimos quatro conclaves, a eleição não passou de três dias - João Paulo I, Bento XVI e Francisco foram eleitos no segundo dia. João Paulo II foi escolhido no terceiro. Nos bastidores, os cardeais comentam que provavelmente, dessa vez, não será nos dois primeiros dias. Muitos apostam no terceiro, a sexta-feira. _

Um lembrete na Praça de São Pedro

Na imensidão da Praça de São Pedro, um monumento atrai, desde 2019, os olhares e o toque de turistas e fiéis. Feita em bronze, idealizada pelo canadense Timothy Schmalz, a escultura Anjos Inconscientes retrata em tamanho natural uma multidão heterogênea de migrantes e refugiados. No seu centro, destacam-se as asas de um anjo, sugerindo a presença do sagrado. A escultura é inspirada em uma passagem bíblica: "Não vos esqueçais da hospitalidade, porque graças a ela alguns, sem saber, acolheram anjos".

A obra foi inaugurada por Francisco, que fez da preocupação com os retirantes uma das marcas de seu pontificado. O Papa desejava que a escultura "lembrasse a todos o desafio evangélico da hospitalidade".

INFORME ESPECIAL

Nenhum comentário: