
EM FOCO
Índice de companhias que não honram obrigações financeiras avança pelo quarto mês seguido em Porto Alegre. Em abril, chegou a 15,4%. Patamar é influenciado pelo ciclo de aumento do juro básico, pelo comportamento do dólar e pelas incertezas em relação ao comércio internacional
Inadimplência de empresas em alta na Capital
Após um início de ano marcado por embaraços nas economias interna e externa, o percentual de empresas com dívidas em atraso engatou nova tendência de alta em Porto Alegre. Em abril, a parcela de negócios inadimplentes subiu para 15,4% na Capital.
Além do avanço ante março, essa é a quarta alta consecutiva no indicador, apurado pela Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre (CDL POA). O período com alta do dólar, novo ciclo de aumento do juro básico e incertezas em relação ao comércio internacional ajudam a explicar esse movimento, segundo especialistas.
Os dados do levantamento apontam que a inadimplência das empresas havia engatado uma descompressão em parte do segundo semestre do ano passado, rodando na casa dos 14%. No entanto, o indicador recrudesceu no início de 2025.
No Rio Grande do Sul, a taxa de inadimplência das empresas teve leve recuo na comparação de abril com março, passando de 14,7% para 14,2%. No entanto, o indicador segue em patamar alto e acima de percentuais observados no meio do ano passado. O indicador de inadimplência leva em conta pendências das empresas com crédito, cheque, protesto ou ação judicial.
O economista-chefe da CDL POA, Oscar Frank, atribui esse cenário a uma série de fatores. Entram nesse rol a aceleração do ciclo de alta no juro, a insatisfação com o pacote de corte de gastos do governo e a taxa de câmbio alta, marcada pelo dólar atingindo recordes no fim do ano. Além disso, a incerteza gerada a partir dos alinhamentos da nova política externa dos Estados Unidos teve peso nesse processo, segundo o economista.
- Muito difícil de separar qual é o peso de cada um desses vetores, mas é o combo.
Gustavo Frio, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS, destaca a escalada da Selic e a pressão que esse indicador causa sobre o endividamento dos negócios, principalmente os de menor porte.
- O juro fica alto e o custo das dívidas aumenta. Com a elevação do custo das dívidas, a chance de as empresas ficarem inadimplentes naturalmente aumenta.
O docente destaca que a enchente também pode ter peso em parte dos casos. Gustavo Frio explica que alguns negócios podem ter utilizado auxílio logo após a tragédia climática, mas voltaram a sofrer com dívidas antigas, majoradas em um cenário com juro mais alto, que dificulta o pagamento das pendências.
Setores mais afetados
Os ramos de comércio e serviços dominam o ranking dos setores com maior número de empresas inadimplentes, levando em conta apenas números absolutos. Ramos como os de vestuário, condomínios prediais, restaurantes, lanchonetes e de cabeleireiros, manicure e pedicure estão no topo da lista.
- Muitos dos setores ainda carregam cicatrizes dos impactos provocados pela pandemia e pelas enchentes. Temos muitos casos de pequenos estabelecimentos, caracterizados por baixa produtividade e com restrições severas de caixa, principalmente para enfrentar cenários de maior dificuldade - afirma Frank.
Gustavo Frio afirma que a deterioração dos salários pela inflação também diminui o volume de consumo das famílias em ramos como comércio e serviços. _
Alternativas para tentar sair da inadimplência
Priorize a geração de caixa, incluindo estratégias para a cobrança de devedores, possíveis antecipações de recebíveis e uma gestão de estoques de acordo com a realidade da empresa.
Realize renegociações com bancos, fornecedores e prestadores de serviços. Isso pode resultar em taxas menores e de acordo com a realidade financeira da empresa.
Busque boas ferramentas para análise e concessão de crédito, procurando reduzir os custos da inadimplência dos clientes para o negócio.
Procure informações sobre programas do governo para tentar refinanciar dívidas. Alguns bancos privados têm produtos para reduzir o custo da dívida.
Contenção na atividade
O economista-chefe da CDL POA, Oscar Frank, afirma que a aceleração na inadimplência das empresas abre caminho para outros efeitos negativos na economia. Esse movimento dá sinais de que a atividade deverá passar por um processo de moderação:
- Isso acaba, de alguma forma, sinalizando para uma moderação, para uma contenção da atividade empreendedora do futuro. Sinaliza que o número crescente de CNPJs está passando por um período de dificuldade, por gargalos financeiros. Isso possivelmente vai afetar negativamente contratações de trabalhadores, compras de insumos e expansões de lojas, de parques produtivos.
O professor Gustavo Frio, da PUCRS, afirma que o alto percentual de pessoas físicas com dívidas em atraso também afeta a situação financeira das empresas, que acabam entrando em inadimplência. Além de não receber alguns pagamentos, os negócios enfrentam um cenário com menos demanda.
- A inadimplência dessas pessoas também está correlacionada a não poder gastar mais. Além de não conseguir pagar as dívidas contraídas, a pessoa não consegue contrair novas. Então, daqui a pouco, tenho um comércio, e o cliente vai deixar de comprar alguns produtos que ele comprava antes, vai começar a comprar menos.
Os dois economistas entendem que a inadimplência das empresas deve seguir alta nos próximos meses, em um contexto no qual a atividade econômica tende a seguir em desaceleração.
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