segunda-feira, 3 de fevereiro de 2025


03 de Fevereiro de 2025
CLÁUDIA LAITANO

Brutalistas

A maioria dos brasileiros pode não associar o nome à fachada, mas o país está repleto de construções influenciadas direta ou indiretamente pela arquitetura brutalista. Pense no prédio do Masp, em São Paulo, no MAM, no Rio de Janeiro, no Centro Administrativo e na igreja evangélica da Praça Otávio Rocha, em Porto Alegre. Pense em Brasília, em Niemeyer, em Lina Bo Bardi, em Paulo Mendes da Rocha. 

Entre os anos 1950 e 1970, em meio à urbanização acelerada do pós-guerra, o estilo estava na crista da onda: concreto aparente, autenticidade de materiais e de formas, pouco frufru, baixo custo. Ao contrário do que muita gente poderia imaginar - maldosamente - o termo não vem do italiano "brutto" (feio), mas do francês "béton brut" (concreto bruto). Esse é um daqueles muitos casos em que a beleza está (ou não) nos olhos de quem vê.

No filme O Brutalista, um dos favoritos ao Oscar, László Tóth (Adrien Brody) é um judeu de Budapeste, formado na Bauhaus, que emigra para os EUA logo depois da guerra. Por um golpe de sorte, o jovem arquiteto subempregado escapa da miséria quando um milionário da Filadélfia decide contratá-lo para erguer uma espécie de memorial - mistura de templo religioso, centro esportivo e monumento à própria glória e fortuna. Tóth coloca toda sua alma no projeto, mas para transformar suas elucubrações em concreto armado vai ter que enfrentar não apenas seus próprios traumas, mas o choque cultural causado por uma ideia de beleza que parece contrariar a razão e a sensibilidade da época e do lugar.

Enquanto O Brutalista ainda lota os cinemas nos Estados Unidos, apesar de suas quase quatro horas de duração, o embate entre clássicos e modernos pulou das telas para as páginas de política. Em meio a uma enxurrada de decisões com consequências potencialmente muito mais graves para o planeta, o decreto de Donald Trump que promete trazer de volta a "beleza arquitetônica" (leia-se colunas e rotundas neoclássicas) para os prédios públicos norte-americanos não chegou a chamar tanta atenção, a não ser como manifesto estético da mentalidade reacionária que tomou conta da Casa Branca.

O fetiche por um estilo anacrônico, tão americano quanto qualquer outra coisa ou pessoa que desembarcou por aqui há mais de 50 anos, reflete boa parte das contradições do populismo pop de direita. Uma ideologia que celebra a "civilização ocidental" e a "cultura clássica", ao mesmo tempo em que ataca as "elites intelectuais". Um exército de defensores da liberdade de expressão e da inovação que não hesitam um segundo em impor aos outros seu "bom gosto" e sua visão nostálgica do mundo. Por decreto, of course. 

O conteúdo desta coluna reflete a opinião do autor

CLÁUDIA LAITANO

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