07 DE JUNHO DE 2019
MUNDO LIVRO
Longas jornadas junho adentro
Escritor jerônimo teixeira lança "Os Dias da Crise", sátira com as manifestações de 2013 como pano de fundo
A certa altura de Os Dias da Crise, novo livro do jornalista e escritor Jerônimo Teixeira, o narrador, um diretor corporativo de nome Alexandre Barbosa, define as manifestações que varreram o país em junho de 2013 como um "estranho evento político sobre o qual muito se escreve e do qual pouco se entende". Talvez por considerar as chamadas "Jornadas de Junho" além da apreensão, Jerônimo opta, em seu romance, por transformar a mobilização em pano de fundo para a história de um único homem entremeada a uma farsa feroz disposta a satirizar vários aspectos da sociedade contemporânea.
Os Dias da Crise enfoca o executivo Alexandre durante os meses anteriores à eclosão das manifestações. Empregado como diretor em uma empresa de perfil duvidoso que está em crise financeira e que recém contratou um picareta de boa lábia para fazer uma gigantesca "reestruturação", ele remói uma relação tumultuada com a filha, participa regularmente de um círculo de discussão baseado na obra de um escritor que fez fama criando um manual filosófico de autoajuda para executivos e engata um romance com uma fascinante professora de Letras chamada Helena. É por meio dela que ele acabará comparecendo a uma das manifestações, em São Paulo, e, embora um cínico empedernido disparando juízos críticos a tudo e a todos, se verá tentado a apanhar uma pedra do chão para jogá-la contra a fachada de um banco, momento que, para ele, sumariza a selvagem confusão daqueles dias.
Entre uma coisa e outra, o olhar sardônico de Barbosa passeia por uma série de situações com tons de fábula psicodélica. Eollo, o CEO trazido para renovar a empresa, investe tudo em um produto a ser fabricado na China mas que praticamente ninguém na companhia sabe o que é. A relação com Helena é idílica até o momento em que o autor começa a se cansar dos jogos eróticos de submissão aos quais ela está acostumada. O próprio protagonista não disfarça em sua loquacidade suas flagrantes contradições.
Crítico de literatura da revista Veja, Jerônimo cria um livro conectado à tradição da sátira humanista, e é possível alinhar muitas de suas intenções a claras citações estilísticas e temáticas. As primeiras páginas, com um Barbosa contraditório justificando que, apesar de estar naquele momento escrevendo um livro, odeia ler, tem ecos da fúria dos narradores de Thomas Bernhard.
De tempos em tempos, Barbosa apela em seu relato ao leitor, seu igual na incompreensão do mundo, em um toque machadiano. Mesmo o nome do guru de autoajuda empresarial cultuado por Alexandre e seus amigos, John Teufelsdröckh (sobrenome que, em alemão, significa "esterco do diabo"), é um aceno a Thomas Carlyle e seu Sartor Resartus. Mais do que uma tentativa de explicar 2013, portanto, o livro de Jerônimo é um conjunto de pedradas disparadas em várias direções para demonstrar um teorema simples: a estupidez geral.
PRATELEIRA
O Ômnibus celeste e outros contos
De E.M. Forster
Edição comemorativa de narrativas curtas publicadas para marcar os 140 anos de nascimento do inglês E. M. Forster (1879-1970). São textos sobre a vida na Era Vitoriana de um autor mais conhecido por seus romances, em especial Maurice, Um Quarto com Vista, Howard?s End e Uma Passagem para a Índia. Lançamento amanhã, das 16h às 20h no bar Terezas (Giordano Bruno, 318, bairro Rio Branco), em Porto Alegre, com a presença do tradutor Vinícius Casanova Ritter. Editora Bestiário, 116 páginas, R$ 35.
As Margens do Paraíso
De Lima Trindade
Lima Trindade, contista e coeditor do saudoso portal eletrônico de literatura Verbo 21, que durou de 1999 a 2015, estreia no romance com um panorama narrativo de vidas comuns durante a construção de Brasília. As Margens do Paraíso cria um mosaico ficcional que une o épico e o íntimo ao acompanhar três personagens de origens distintas, Leda, Zaqueu e Rubem, no fim dos anos 1950. Usando o pano de fundo do otimismo impulsionado pela construção da Capital, Lima cria uma história sobre a relação do Brasil com o poder. Cepe Editora, 270 páginas, R$ 35.
Primeira Pessoa
De Luiz Paulo Faccioli
O autor gaúcho Luiz Paulo Faccioli lança um novo livro de contos, gênero no qual se enquadra boa parte de sua produção ficcional desde sua estreia, com Elepê (2000) e mais tarde com Trocando em Miúdos (2008), além da participação em múltiplas antologias por diversas editoras. Primeira Pessoa traz textos curtos que, como o título anuncia, são narrados pela voz de seus protagonistas. O tema dos afetos e das relações predomina no conjunto, que também faz uso de um agudo sentido de observação. Editora Metamorfose,130 páginas, R$ 35.
Contos de Pampa e Fronteira
De vários autores
As escritoras Anna Mariano e Débora Mutter apresentam esta coletânea de contos com mais 11 autores convidados, entre eles os experientes Colmar Duarte, José Francisco Botelho e Maria da Graça Rodrigues. As narrativas abordam o passado e o presente do pampa sob enfoques diferentes. Com dramas familiares, "causos", histórias de crime e vingança, os contos documentam o jeito de ser e de falar da fronteira gaúcha. Lançamento na próxima quinta-feira, dia 13, às 18h, no hall de entrada do Teatro Renascença (Avenida Erico Verissimo, 307), em Porto Alegre. Viapampa, 214 páginas, R$ 40.
CARLOS ANDRÉ MOREIRA
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