terça-feira, 4 de junho de 2019



04 DE JUNHO DE 2019
GDI

FACÇÕES NA VENDA DE PIRATAS

COMERCIANTES DIZEM OPTAR PELO CIGARRO FALSIFICADO em razão do lucro fácil ou porque são coagidos pelas organizações criminosas a entrar no negócio
O Grupo de Investigação da RBS (GDI) constatou vários indícios de que uma facção criminosa está por trás da fabricação de cigarros paraguaios no Rio Grande do Sul, fenômeno retratado ontem em Zero Hora. Comerciantes foram abordados por integrantes desse grupo, com origem no Vale do Sinos, e tiveram a mercadoria verificada para garantir que só vendessem as marcas ligadas a essa facção.

Os comerciantes foram seduzidos pelo lucro e, quando em dúvida, forçados. Alguns bandidos se passaram por policiais, para coagir comerciantes. O dono de um mercado, no Vale do Taquari, que só vende cigarro paraguaio diz ter sido aconselhado a não vender tabaco legalizado:

- Fiquei sabendo que tinha outros vendendo. Entrei nessa pelo lucro. Ambição do dinheiro. Com cigarro fabricado no Brasil tu ganhas R$ 0,25 por carteira. Paga R$ 7,50 e vende a R$ 7,75. No Classic paraguaio, paga R$ 2,10 pela carteira e vende por R$ 3,50, R$ 4. Vale o mesmo para Paladium e Bill. Tem muita procura. Vendia uma caixa por semana, com 500 maços. Pagava R$ 1,1 mil por ela. Chegou um cara oferecendo, peguei. Comecei a comprar. Aí fiquei com medo... O sujeito me disse: "Melhor tu continuar vendendo. 

É bom para ti. Entenda como quiser". Como já fui assaltado, apesar de estar errado continuei fazendo a venda. Vai saber? Sorte que não deu coisa pior. Eles só vendem marca paraguaia, em vários lugares da cidade. A cada dia aparecia um entregador diferente. Carro e moto diferente. Dinheiro na mão, nada de crédito. É um esquema muito bem organizado. E não é só aqui. Lá em Tramandaí, no camelódromo, no Centro, tem cigarro empilhado. Quando deu problema, levaram meu cigarro, deu Polícia, apreenderam meu estoque. Avisei que não queria mais. Eles não voltaram.

O delegado Paulo Costa, que atua na Polícia Civil em Montenegro, corrobora a informação dos comerciantes e diz que investiga o domínio exercido pelas facções na venda de cigarro paraguaio no varejo. O mesmo estaria acontecendo em toda a Região Metropolitana. O comércio ambulante de cigarros clandestinos é disputado pelas facções, assim como o contrabando na fronteira.

FUMO É LEVADO NA MIRA DE ARMAS

MÁRCIO JALKUTSKI

Produtor rural em Chuvisca, no sul do Estado

"Levávamos três caminhões carregados de fumo para Venâncio Aires, umas quatro horas de viagem. Nas proximidades de Vale Verde, os pneus de um dos veículos furaram, acho que eram miguelitos colocados na estrada. Mal a gente parou e uma caminhonete estacionou atrás. Três caras armados desceram e mandaram sair dos caminhões. Fomos levados na caminhonete e num dos caminhões, com cabeça abaixada, proibidos de olhar para a frente. Rodamos por quatro horas, em estradas de chão, até nos obrigarem a descer num matagal. Nos amarraram e começaram a descarregar o fumo dos veículos. Levaram umas 15 toneladas, o equivalente a R$ 200 mil em mercadoria, além do caminhão. Nos avisaram que o veículo seria abandonado e assim aconteceu. Nos desamarramos e tocamos a vida. Os outros dois caminhões não chegaram a ser roubados porque um taxista estranhou o abandono e chamou a BM, que recuperou os veículos. Nossa empresa já sofreu outro roubo em 2016 e na nossa região foram 10 assaltos em 2016".

LETIERE VAZ

Produtor rural em Barão do Triunfo, no sul do Estado

"Era fim de tarde. Eles entraram na minha propriedade e renderam, na casa, minha esposa. Três caras armados. Depois, dois deles foram até o galpão onde seco fumo e também me renderam. Fomos colocados de bruços no chão, cobertos com um lençol. Perguntaram de dinheiro e armas. Pegaram o que puderam, levaram uns eletrodomésticos. Mas o que queriam, mesmo, era fumo. Só saquearam a residência porque tiveram oportunidade. 

Eles encheram minha caminhonete com fumo e eletrodomésticos e levaram. Tive um prejuízo de R$ 16 mil em fumo, mais o veículo perdido. Mas o maior problema é que não consegui mais morar naquela casa. Foram 40 anos naquele lugar, nasci e me criei junto à lavoura, agora coloquei tudo à venda. Em três dias abandonei o esforço de uma vida. E não sou só eu. Perdi a conta dos casos de assalto como o que nos aconteceu".

FÁBIO ALMEIDA E HUMBERTO TREZZI

Nenhum comentário: