sábado, 30 de junho de 2012



30 de junho de 2012 | N° 17116
CLÁUDIA LAITANO

Mulheres que sabem rir

Nora Ephron não terá sido a primeira mulher a tirar proveito de um orgasmo fingido, mas provavelmente foi a primeira a ficar famosa por causa de um. A clássica cena do filme Harry & Sally – Feitos um para o Outro (1989), em que Meg Ryan prova para Billy Cristal que nem tudo que reluz é ouro, foi o passaporte para o reconhecimento mundial da escritora, roteirista e diretora americana – que morreu esta semana, aos 71 anos, de leucemia.

Para quem tem tanto pavor de comédias românticas quanto eu de debates sobre futebol, o nome de Nora Ephron costuma ser associado à excruciante experiência de assistir a tramas açucaradas estreladas pelos astros da vez de Hollywood – o que talvez não seja justo com sua longa e produtiva trajetória como humorista e ensaísta com raro senso de observação.

Mais do que a grande dama das comédias românticas, Ephron foi uma escritora capaz de rir de si mesma e dos outros – nem sempre nessa ordem. Em 1972, com um ensaio intitulado Algumas Palavras sobre os meus Seios, tornou-se conhecida nos Estados Unidos imaginando como teria sido sua vida, e sua personalidade, se tivesse nascido com uma comissão de frente mais exuberante (quem nunca...). Não era um texto cômico, no sentido pastelão do termo, mas um artigo que fazia rir e pensar desde uma outra perspectiva – a feminina – em uma época em que isso ainda não era tão comum.

Dez anos depois, com o romance Heartburn, em que narra o fim do casamento com Carl “Watergate” Bernstein, transformou outra pequena grande desgraça feminina – ser traída pelo marido, com a melhor amiga, quando estava grávida do segundo filho – em uma história divertida e emocionante, com a qual mulheres de várias gerações se identificaram.

Nora Ephron ajudou a abrir caminhos para escritoras e jornalistas mais jovens que, inspiradas por ela, exploraram uma nova forma de expressão do universo feminino:

se as mulheres queriam dividir responsabilidades com os homens em casa e no trabalho não podiam levar-se tão a sério o tempo todo. Sim, o mundo (ambos os gêneros aqui incluídos) precisa de escritoras como Virginia Woolf e Clarice Lispector, de pensadoras como Simone de Beauvoir ou Hannah Arendt e de contadoras de histórias como Agatha Christie ou J.K. Rowling, mas igualmente indispensáveis são as escritoras capazes de ver o lado cômico de situações e circunstâncias que nenhum homem, por mais atento ao sexo oposto que seja, teria condições de descrever. “Minha mãe sempre nos ensinou que aquilo que é tragédia num dia pode se tornar piada no outro”, dizia a escritora.

Nos seus dois últimos livros, Meu Pescoço é um Horror (2006) e Eu não Lembro Nada (2010), Nora Ephron tentou provar que é possível rir até mesmo do que não parece ter graça nenhuma, como a decadência física e a finitude humana. Em Eu não Lembro Nada, escrito quando ela já sabia que estava doente, Nora fez duas pequenas listas: uma das coisas de que sentiria falta e outra das que não. Não sentiria falta: de barulho de aspirador e de debates sobre A Mulher no Cinema. Sentiria falta: dos filhos, de Nick (o último marido), de tomar banho, de cruzar a ponte em direção a Manhattan e de comer torta.

Nós, leitores e fãs, vamos sentir muita falta dela.

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